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24.12.07

Sete Filmes em 2007

1 – O Ano Em que Meus Pais Saíram de Férias (Brasil, 2006, 110´, dir. Cao Hamburger, com Michel Joelsas, entre outros)
Enquanto aguarda notícias dos pais, que estão fugindo da repressão militar em 1970, o garoto Mauro é iniciado num longo périplo de descobertas, sob os cuidados de um solitário zelador da sinagoga do bairro do Bom Retiro, em São Paulo.
Uma rara sutileza das variações diversas do fazer fílmico, seja no aspecto político, na ação da memória(o roteiro é semi-auto-biográfico), na construção dos personagens, e na noção objetiva da discussão religiosa sem quedar-se para discursos passionais.

2 – Medos Privados em Lugares Públicos (Coeurs, França-Itália, 2006, 120´, dir. Alain Resnais, com Sabine Azéma, Lambert Wilson e outros)
O relacionamento humano sob os mais diversos(e complexos) ângulos, como, por exemplo, o corretor que tem uma maneira muito peculiar de amar a amiga de trabalho, entre outros casos.

3 – O Passado (El Pasado, dir. Hector Babenco, Brasil/Argentina, 115´, com Gael García Bernal, Ana Celentano, e mais)
Um casal termina seu longo casamento. Enquanto ele tenta reconstruir sua vida, sua ex torna-se uma pedra em seu sapato. Uma lúcida visão de como vive-se o relacionamento amoroso nas urbes contemporâneas desse século.

4 – Piaf – Um Hino ao Amor (La Vie Em Rose, França-Inglaterra-Rep. Tcheca, 2007, 140´, dir. Olivier Dahan, com Marion Cottilard, Sylvie Testud, Gerard Depardieu, e outros)
A vida da grande diva da música francesa, Edith Piaf, contada a partir das fatalidades que configuraram a sua vida.

5 – Jogo de Cena (Brasil, 2007, 100´, documentário, dir. Eduardo Coutinho, com Marília Pêra, Fernanda Torres, Andréa Beltrão, e outras)
O que é a “ficção” diante de uma câmera? Quem está representando, e o quê? O que é cinema e é teatro, o que é vida e é imagem midiatizada, o que é profundo e o que é rarefeito; tudo pode ser modificado ou solidificado por uma câmera.

6 – O Grande Chefe (The Boss of it All, Dinamarca, 2006, 100´, dir. Lars Von Trier, com Jens Ibinus e Peter Gantzler, e mais um grande elenco)
O dono de uma empresa, para não ter que assumir certas responsabilidades, inventa uma matriz fictícia, nos EUA, de onde “vem” as ordens de demissão, entre outros assuntos delicados. Ocorre que os interessados em comprar a firma querem conhecer o “chefe”. Então o empresário contrata um ator de teatro para desempenhar este papel.

7 – Império dos Sonhos (Inland Empire, EUA-França-Polônia, 2006, 180´, dir. David Lynch, com Jeremy Irons, Justin Thoreaux, Laura Dern, e outros)
O que acontece quando uma atriz se apaixona pelo ator, mais do que pelo personagem? Ou quando a encenação de um texto é um arremate contra uma tragédia acontecida com o elenco anterior? Esse o mote da história, uma radicalização do processo criativo de Lynch, aqui apenas com câmeras digitais, e cenografia e fotografia que são um espetáculo à parte.

EPÍGRAFE

"no consigo ser la misma,
me domina la contradicción".
(Pedro Herrero, pela voz de Mercedes Sosa)

22.12.07

A TRILHA SONORA DAS VILAS

Hoje, voltando para casa, não sei se motivado inconscientemente por alguma conversa paralela no trem, me peguei listando a trilha sonora do subúrbio nas três últimas décadas. Apesar do asco(pretensamente intelectual), confesso que foi um exercício gostoso lembrar que no início dos anos 80, quem imperava nas rádios e nos aparelhos 3-em-1 eram, pela ordem, Martinho da Vila, Agepê, Clara Nunes e Benito di Paula. Na continuação, a lista também poderia citar Amado Batista, Perla, Trio Parada Dura, Carlos Alexandre e Barros de Alencar. Cabe aqui também o sucesso fugaz da banda Blitz. A segunda metade dessa mesma década viu a explosão do RPM e seu pop-rock intelectualóide, mas de postura mais voltada ao imediato midiático e sensual. A eles se somaram Jovelina Pérola Negra, Almir Guineto e o franzino garoto Zeca Pagodinho. O trono maior, porém foi ocupado incontestavelmente por Bezerra da Silva, cronista suprarreal de um mundo tão à margem que muitos ainda hoje julgam realidade fictícia e/ou apologia simplória da malandragem. Os anos 90 viram o cetro da liderança ser passado ao grupo Racionais MC’s. O domínio da linguagem lírica e dura do rap, recriando a crônica do real a partir de novos enunciados poéticos, permitiu aos manos racionais adentrar o terreno periférico de forma mais ampla, mais geral e mais irrestrita. O surto roqueiro ocorrido na década anterior entrava em eclipse, mas deixava suas marcas com a visceralidade dos Raimundos e Skank, além do curto-circuito provocado pelos Mamonas Assassinas, abatidos ainda na decolagem do sucesso. E em qualquer tarde de sábado ou domingo, ou nas longas noites de sexta, sempre tinha uma casa, ou um carro velho, mas equipado com um "Pionner", tocando grupos de pagode(Raça, Raça Negra, Katinguelê, Exaltasamba e Só Pra Contrariar, entre outros), axé(É O Tchan, por exemplo); e então sepultamos o século 20. O amanhecer do novo século viu nascer junto consigo, ainda sob o completo domínio da sisudez racional(que perdura até hoje), outros grupos de rap, forró e pagode. Mas essa presença está sendo confrontada com o advento do funk pancadão, oriundo dos morros fluminenses, que com sua alegria e linguagem chulas, sua sexualidade exarcebada e provocações adolescentes, tomou de assalto os adolescentes paulistanos. Raul Seixas, Jorge Benjor, Xuxa e Legião Urbana recebem registro, pois são constantes e imexíveis no bolo da massa musical periférica. Acima deles, reinam absolutos Tim Maia e Roberto Carlos, que cobrem um longo período musical no imaginário suburbano paulistano e brasileiro, agregando a atenção de jovens, adultos e velhos. Se alguém tiver dúvidas sobre essas informações, não discutirei, pois essa não tem caráter sociológico ou estatístico. Mas é só dar um rolezinho pela Cidade Tiradentes, Cohabs de Carapicuíba, Itaquera e Taipas, Capão Redondo, Elisa Maria, Embu, Itaim Paulista, Heliópolis, Jaraguá, Taboão, Canão, Embu, Paraisópolis, São Mateus ou mesmo na Ladeira General Carneiro num domingo à tarde, e depois vir contar que posso até estar esquecendo algum nome e ou sobrepesando outros. Mas que essa é a realidade, não há dúvidas.
* Publicado originalmente no jornal "O Grito"(j.ogrito@uol.com.br - Monteiro Lobato, SP), nº 9, JULHO DE 2007

16.12.07



Prédio do MASP(Museu de Arte de São Paulo), decorado para o natal. Av. Paulista, terça-feira, 11/12/2007, 22:32h.

DECORAÇÃO NATALINA

Árvore do Parque Trianon, debruçada sobre a av. Paulista, com o caule enfeitado para o natal. Terça-feira, 11 de dezembro de 2007, 22:31h.

12.12.07

SAMPA – UMA BIOGRAFIA ITINERANTE

Mostra Internacional de Cinema, Free Jazz Festival, Philips Monsters of Rock, MUBE, Carlton Dance Festival, MIS, Salão do Automóvel, Virada Cultural, Itaú Cultural, Bienal Internacional, MASP, Centro Cultural Banco do Brasil, Parque Ibirapuera, Parque da Aclimação, Zé do Caixão, Arnaldo Antunes, Rita Lee, Lira Paulistana, Aeroanta, Centro Cultural São Paulo, Pinacoteca, Galeria Olido, Centro Cultural São Paulo, Cidade Universitária.
Cidade Tiradentes, Diadema, Capão Redondo, Itaim Paulista, Marcola, Favela do Gato, Favela do Canão, Cracolândia, Largo 13, Guaianases, Grajaú, Praça da Sé, PCC, Maníaco do Parque, Largo da Batata, Largo da Concórdia, 3ª Divisão.
Não esqueça nada disso. Esqueça tudo isso.
Esquecer ou lembrar são os dois verbos possíveis e impassíveis diante dessa moeda capital, a memória. E a dita é quem possibilita as diversas mariposas em torno dessa luz, a diversidade. E o diverso, o diferente, é quem equaliza o som da vida. É ele quem condimenta o mundo.
Agora pense em São Paulo – a capital – ou Sampa, ou Paulicéia Desvairada, ou a Terra da Garoa – não importa a alcunha – sendo isso. É preciso entendê-la assim, metrópole do "país do futuro", porém cosmopolita e provinciana. Comece pelos caldeirões multiétnicos que vão do bairro do Bom Retiro(mundo multifacetadamente árabe e judaico), ao bairro da Liberdade(nipônico), do Bixiga com sua italianidade heterodoxa, à noturna e sorridente Vila Madalena.
Dê uma passada na mítica rua Santa Ifigênia, templo aberto de culto ao mundo eletro-eletrônico, dos Play-Stations "destravados", dos DVDs chineses, dos brinquedos paraguaios, dos softwares "piratas". Dali, passe pelo viaduto homônimo e entre na rua Florêncio de Abreu, paraíso das ferramentas e maquinarias. Mais um salto abaixo e então estamos 25 de Março, talvez a rua mais famosa de toda a América Latina no quesito comércio popular. É lá que você encontra tudo o que imaginar para armarinhos, tecidos, brinquedos e quinquilharias eletro-eletrônicas, além de outros apetrechos, trecos e bugigangas. Agora tome o metrô para o Jabaquara, desça na estação Paraíso e comece a debutar na av. Paulista via Bernardino de Campos. Lá, entre gravatas e cofres, também encontraremos a onipresente parafernália dos eletro-eletrônicos(computadores, MP3, I-PODs, aparelhos de som, games, CDs, DVDs, palm-tops e monitores). Saiu de lá, desça pela av. Rebouças ou rua Cardeal Arcoverde sentido Praça do Pôr-do-Sol, em Pinheiros. O nome explica tudo. É impossível sair de lá sem se apaixonar, nem que seja pela própria respiração. No retorno, passando pela rua 13 de Maio, no coração do Bixiga, experimente não ficar mais gordo numa daquelas cantinas de sotaque paulistanado, evidenciado por outros dois ícones da cultura pop dessas bandas: Demônios da Garoa e Adoniran Barbosa. Antes, uma licencinha para voltar a Pinheiros: é melhor nem tentar entender porque a rua Teodoro Sampaio é um mito dos instrumentos musicais, entre tantas outras que a Paulicéia abriga.
Quer mais? Desça pela av. Rangel Pestana a partir do marco zero da Praça da Sé e chegue ao éden do vestuário popular, o bairro do Brás. Quer roupa sofisticada? Então tome Oscar Freire. As roupas são filhas das mesmas oficinas, a diferença está no preço da etiqueta. Quer agora uma explicação não teórica para a um tipo inespecífico de democracia? Galeria do Rock! Ali, na rua 24 de Maio, no centro velho: sub-solo e térreo são para os "manos e minas" da cultura hip-hop, o 1º e 2º andar para os cultores do rock(e todas as suas tendências e variações). Acima, a indústria do silk-screen. Tudo em um único prédio.
Uma outra divagação teórica: por que é que algumas linhas de trem da CPTM tem ar-condicionado melhor que o Metrô ISO 9000? Mas o que se ganha em ar fresco perde-se em atrasos, mendicância e na informalidade comercial e de pedintes. Parece-me essa a verdadeira vocação da malha ferroviária, numa metáfora infeliz sobre o Brasil. Aproveitando a deixa, uma curiosidade: por que a estação Domingos de Moraes, na zona oeste, tem uma das melhores exposições abertas de arte urbana e não é citada em nenhum catálogo? E o ingresso custa a pataca de R$ 2,30, o preço do embarque. Um preço caro para andar em trem sujo e mal- conservado, mas bem barato para curtir arte moderna, urgente e urbana, com artistas criativos que não fazem parte dos circuitos do mainstream.
Sampa também tem três enormes, floridos, arborizados, maravilhosos e fedidos rios: Tietê, Pinheiros e Tamanduateí.
A Terra da Garoa tem TODAS as estações do ano num único dia. E(coincidência?), duas bicas d´água nas duas Cohab 2: em Itaquera, na av. Nagib Farah Maluf, em frente à estação José Bonifácio. No lado oposto da cidade, em Carapicuíba, na av. Amazonas, em frente à lanchonete Seringueira. Sábado e domingo em ambas são dias sagrados pra quem quer manter a caranga limpinha sem gastar bulhufas.
E tem também o Sarau da Cooperifa, lá nos confins da zona sul, dirigido pelo incansável Sérgio Vaz(http://colecionadordepedras.blogspot.com). Espaço democrático para o dramático exercício da abstração: ler poesia feita por quem está à margem. E de lá manda sua mensagem.
E tem muito, muito mais por aí.
Por ora, fiquemos com esse pequeno aperitivo introdutório.

* Texto publicado originalmente no jornal O Grito(Monteiro Lobato, SP), Nº 2, Novembro de 2006, com pequenas alterações.

11.12.07


obtuso

tão tonto fico

quando fico pronto

que fico em silêncio

(esse poema que não se acaba em mim)

do livro hardrockcorenroll, Ed. Scortecci, SP, 1ª ed. 1998, p. 69

3.12.07