“Primeiro Livro de Poesia - Uma introdução aos
poetas de Moçambique” - Pedro Pereira Lopes (org.)
Antologias literárias são sempre discutíveis, em
geral por dois motivos óbvios e complementares: primeiro por ser uma tentativa
de escolha objetiva de um ou vários sujeitos. Segundo: por mais que se
esforcem, os indivíduos nunca são objetivos, trazem em si essa contradição
humana, apropriar-se de fragmentos de saberes que serão uma marca única e
indelével. Essa condição os impele pra frente, pro lado, acima e, outras vezes,
para trás ou abaixo, em processos sempre mutantes e nunca finalizados.
“Primeiro livro de poesia - Uma introdução aos
poetas de Moçambique”, antologia organizada pelo escritor e editor Pedro
Pereira Lopes, trabalha essa dicotomia com um voo panorâmico sobre a poesia
produzida em Moçambique desde os tempos coloniais até hoje. Editado pela Escola
Portuguesa de Moçambique – Centro de Ensino e Língua Portuguesa (EPM-CELP), o
livro é pequeno mas possuidor de uma fartura de nomes representativos da poesia
do país lusófono encravado na costa leste africana. Constituído por 60 páginas
bem sortidas, o livro de Lopes cumpre com méritos o que se propõe: visibilizar
poetas locais que despertam, encantam e arregimentam leitores (e por que não
dizer futuros poetas?) para a literatura moçambicana.
aproximar
os ouvidos à terra / ouvir a folha / como criança / riscar o chão com a dúvida
/ é o que procuro no relógio (“Ouvir a folha”, Nelson Lineu)
Com introdução da escritora e editora Teresa
Noronha e prefácio de Alberto da Barca, a obra parece optar por nomes que
exprimem a diversidade da produção poética moçambicana. Além de Lineu, Angelina
Neves, Calane da Silva, Eduardo White, Glória de Sant’Anna, José Craveirinha,
Luís Carlos Patraquim, Mia Couto, Mutimati Barnabé João, Noémia de Sousa, Rui
de Noronha, Rui Nogar, Sónia Sultuane e Tânia Tomé, são alguns dos nomes
contemplados pela pesquisa de Lopes.
Ninguém /
oferece flores // A flor, / em sua fugaz existência, / já é oferenda. //
Talvez, alguém, / de amor, / se ofereça em flor. // Mas só a semente / oferece
flores.
(“Flores”, Mia Couto)
Como pode ser observado, a seleção para esta
coletânea contempla nomes conhecidos mundialmente, como Mia. No Brasil, que tem
se tornado um espaço de trocas com a literatura de Moçambique, outros nomes já
estão sendo publicados, ainda que de forma irregular. Neste panteão, podemos
citar Angelina Neves, Sónia Sultuane e o próprio organizador, Pedro Pereira
Lopes, que estão em alguns circuitos alternativos em terras tupiniquins.
Hoje vi
uma borboleta pequena, / que escrevia no ar uma grande pauta musical, / maior
do que ela, ela insistia, insistia / em chamar minha atenção, / ajoelhei-me
para escutá-la, chorei de emoção / ela disse-me, / diz à tua mãe, / que no seu
colo, / quando ela te embalava, / ouviste a música mais bela do seu coração. (“Colo da minha mãe”,
Sónia Sultuane)
Com um trabalho de ilustração sutil da artista
visual portuguesa Filipa Pontes, amalgamado à textura poética da obra,
“Primeiro Livro de Poesia - Uma introdução aos poetas de Moçambique” figura
como trabalho que pode 9e deve) ser editado no Brasil em um futuro próximo. Os
textos revelados na coletânea mostram uma pluralidade de vozes selecionadas com
rigor (a meu ver, com a objetividade discorrida no primeiro parágrafo). A
expectativa para o público brasileiro é a de que a partir de agora tenhamos um
leme seguro para navegar nos mares poéticos do país-irmão, e com ele uma
bonança nesse mar de trocas e aprendizados.
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Pedro Pereira Lopes, organizador, em São Paulo, 2019 (foto: Facebook/PPL)
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Serviço:
Livro: “Primeiro
Livro de Poesia - Uma introdução aos poetas de Moçambique”
Organizador:
Pedro Pereira Lopes
Ilustrações: Filipa
Pontes
Introdução: Teresa
Noronha
Prefácio: Alberto
de Barca
Ed. Escola Portuguesa de Moçambique-CELP (2022)
60 pág.
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