Há muito tempo venho debatendo sobre como escrever sobre a produção literária na zona leste da cidade de São Paulo. Quero lembrar que estas linhas são apenas um aperitivo introdutório àquilo que entendo como literatura praticada por essas bandas. E não custa nada enfatizar que entendo como produção literária todo o universo que compõe a pluralidade textual, incluindo aí não só aqueles que fazem a escrita ficcional ou não, mas inclusive aqueles que tornam o universo das letras a sua profissão de fé, como historiadores, jornalistas e - evidentemente - os professores. E convém lembrar que o que chamo zona leste nada tem de exercício xenofóbico microcósmico. É apenas uma idéia geográfica que uso para denominar uma parte de São Paulo, com suas riquezas relativas, sua gente, sua pobreza e seus desacertos, querendo provocar alguma cócega no marasmo literário paulista. Neste mundo zona leste existem poucas livrarias ou editoras de representatividade qualitativa. Até as bancas de jornais, que são um passo de iniciação na vastidão das letras, são poucas, com uma variedade tacanha de revistas, jornais, dvds, cds, cds-rom ou livros a se encontrar.
Mas há muita gente produzindo textos legais e - principalmente - um público leitor irrequieto, crítico e inteligente. Quem teve ou tiver a oportunidade de frequentar uma roda literária, um sarau ou equivalente, vai sair embasbacado com a proliferação de tantos poetas, contistas e ficcionistas. No concertos de rap, nas quadras de escolas de samba, no ensaio das bandas de rock nas garagens, também podemos encontrar muito dessa atividade que estou a dissertar aqui.
Como militante cultural e artista, em cada vão que descortino nos escombros dessa periferia ferida, estou convencido que bairros, vilas, o subúrbio como um todo, comporta uma rica colcha de retalhos, onde se pode garimpar textos que com certeza ajudam e muito a enriquecer as letras tupiniquins.
Ouso lembrar, contudo, que a caudalosa maioria daquilo que é feito na zona leste é frágil demais para ser chamado "literatura", no máximo rompantes juvenis, fulcros emocionais, que o tempo e a crítica irão tragar com certeza. O que não deve ser usado como elemento desencorajador. É a partir destes "rascunhos" que irá surgir a rutilância do diamante. É a partir do embate diário com a caneta e o teclado, do exercício metódico e cotidiano que possibilitaremos o surgimento de novos nomes que irão dignificar o texto de São Paulo e do Brasil. Quiçá do mundo.
Nesta embalagem que tento formular, quero dispor de alguns nomes que me surgiram nesta empreitada pelas alamedas literárias de bairros tão díspares como Itaim Paulista, Moóca, Vila Esperança, Vila Cisper, Tatuapé, Cidade Tiradentes, Penha, São Mateus, Itaquera, Guaianases, e por aí vai... Nessas caminhadas tive a oportunidade de encontrar pessoalmente ou me deparar com textos de Marciano Vasques(prosa), Cida Santos(biografia), Paulinho Bomfim(conto), Cláudio Gomes(poesia), Vânia Cardoso Coelho(ensaio e ficção), Claudemir Santos(prosa, poesia e teatro), Rosilene Valério(poesia), Costa Senna(prosa e poesia), Wilson Paulo da Costa(ficção), Nilda Magalhães(poesia e ficção), Dalvina das Neves(poesia), Olimaris de Freitas(poesia e teatro), Antônio Primus(teatro), Luciano dos Santos(poesia), Walffy Magalhães Biserra(teatro e ficção), Sueli de Souza(poesia), Nilda Magalhães(poesia), Akira Yamasaki(poesia), Ivan Néri(prosa, poesia e teatro), Azhu´l(poesia e teatro), Marcelo de Oliveira(poesia e ensaio), Alessandro Buzzo(ficção), Paulo Rodrigues(ficção, incensado por Raduan Nassar e Marcelo Coelho, entre outros, por seu "À Margem da Linha"), Sydney Bomfim(teatro), Carlos Teixeira de Freitas(prosa e poesia), Ernesto Martinho Filho(poesia) e Waldomiro Grenhanin(poesia).
Sem dúvida alguma, há muito mais gente, outros talentos, neste perímetro denominado zona leste. Alguns eu omiti por não saber ou lembrar o nome. Outros, pela dúvida que paira sobre os seus trabalhos. O que tenho visto, contudo, nestes saraus e concursos distribuídos a granel, é que, se o balaio acondicionar, ainda assim vai faltar espaço pra muita gente.
O que eu quis, desde o início, foi suscitar uma polêmica, chamar a atenção, provocar. É esse o papel que reconheço do verdadeiro jornalismo: questionar, pôr à prova, duvidar e, se for o caso, elogiar.
Continuo, continuarei a minha peregrinação pelos vãos dessa região inóspita de atenção real. Ainda falta encontrar o pessoal que está fazendo o rap, o choro, rodas de samba, artes plásticas, teatro, vídeo, dança. Enquanto caminharmos nessa margem, estaremos propensos a encontrar esses prodígios, não só por suas aptidões mas - e principalmente - por sobreviverem na zona leste.
(publicado originalmente nos jornais "Frente e Verso"(Ermelino Matarazo, SP), "José Bonifácio em Notícias"(Itaquera, SP), "Cidade Tiradentes em Notícias"(Guaianases, SP) e "O Grito"(Monteiro Lobato, SP). Também no sítio literário www.recantodasletras.com.br/autores/escobarfranelas. Com alterações)
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