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27.2.18

Um textículo: "rebelião"


acho que chegou a hora
acho que já passou da hora
de prender essa intolerância
que anda à solta por aí
de algemar esse ódio no poste
e deixá-lo morrer à míngua
acho que já passou da hora

de cometer uns crimezinhos inéditos por aí
trucidar a inveja que abala e abate
a morbidade humana 
a deformidade das almas

chegou a hora de dar um basta
na violência da submissão
uns gritos ao pé do ouvido
dessa timidez mórbida
uns petelecos bem dados na cara
de quem ousar baixar a cabeça

na guerra crua e cruel
morre duas vezes aquele
que tem medo de matar

26.2.18

Um textículo: "desabotoo"


tantas maneiras de dizer te amo
e eu dizendo de todas as formas
até que a vida se farte
se complete de tanto tanto tanto
mesmo sabendo que amor nunca se farta

no máximo, infarta.

amor é tatuagem no peito
por isso desabotoo

25.2.18

Um textículo: "fuga da rima"


tento fugir da rima
mas não consigo
e quanto mais tento deixar
o verso solto no limbo
à meia-altura, um tanto abaixo
nem tanto assim acima
mais ele ganha gordura 
e pesa, e pensa, e posa
como um seixo
lastro mal colocado
depois da vírgula, antes do ponto.

intento fugir da rima
mas sou impreciso
e quanto mais recorro aos recursos
mais o verso alaga
no álcool de um blues antigo
no improviso do jazz
no sangue de uma tragédia grega 
ou brasileira, tanto faz.

eu tento tento tento fugir da rima
mas mal consigo sair do prumo

24.2.18

um textículo: "inspiração vs. transpiração"


escreve escreve escreve
rascunha risca rasura
reescreve
diz que dessa vez sai
diz que vem, diz que vai
mas aqui não, hai
cai

20.2.18

Um textículo: "as estações do dia"


o sono é outono
trocar as folhas, crescer, renovar
trocar a cor

primavera, acordar, ser flor

verão e inverno
o inferno do dia-a-dia

eis a  vida 
às vezes dor doída, dolorida
de suor insuportável

às vezes não

18.2.18

17.2.18

Um textículo: "a palavra ama, ama!"


a palavra arma reproduz
todos os estilhaços
que as armas provocam

a palavra alma é translúcida
transcendental
como o espírito transparente
que a leveza da alma lhe empresta

a palavra ama
ama

nada mais gravita ao seu redor

quem ama
ama
com toda arma
com toda alma
do amor
ilimitado

(itu, sp, 02/01/18)

16.2.18

Um textículo: "viagem interior"


bauru, jaú, barra bonita, itu
raquel, joão, arthur, eu
na praça da alimentação
se alimentando de ilusões 
pequenos dissabores de feriado
de distração, de amor
sem piscina ou cachoeira
resta-nos a felicidade sincera
do banho de chuva

há uma beleza selvagem
atrás de cada movimento
talvez a riqueza maior
na ideia de viagem

tem um pote de ouro
no sorriso de cumplicidade
mas toda boca aberta é um arco-iris
pode ser ponte
de farsa ou felicidade

(itu, sp, 03/01/18)

15.2.18

Um textículo: "o normal mente"


a cidade parece estar funcionando 
normalmente

por trás do esguicho da mangueira
da onomatopeia do martelo
do barulho da engrenagem da máquina de algodão doce
e do motor cansado
o normal mente
e toda a vida está por um fio

14.2.18

Um textículo: "em novembro, o natal parece longe"


às vezes fico pensando
nessa poeira quente da estrada 
quase delirando sob a vertigem 
das lembranças de coisas 
que nunca passam
das coisas que já passaram
e das coisas que estão por aí

tudo parece igual 
nada é igual
tudo é indiferente: 
o tempo a distância as pessoas
que parecem normais

em outubro eu já tô esperando 
as férias de janeiro
mas antes tempos que superar
as perdas de novembro e dezembro
antes temos que remover
as pedras de novembro e dezembro

13.2.18

Um textículo: "homens e espelhos"


um homem cego
diante do espelho
é só um homem 
que nada vê

um espelho diante de 
um homem cego
é um objeto plano
sólido, duro

um homem que enxerga
diante do espelho
é um homem que vê

um espelho diante
do homem que vê
é um objeto que enxerga
os olhos do homem que vê

9.2.18

Um textículo: "vs. vc"


fiz versos para você
não eram de amor
e sim um poema selvagem
de vento querendo ser brisa
de brisa sonhando ser vento
e nós entre eles, a
mando estar ali 

essa poesia de sermos diversos
vestidos de uma nudez completa
mente transparente

5.2.18

Um textículo: "egópolis"


na cidade de egópolis
o coração habita um vasto sobrado
na rua principal
atendido por mordomos suarentos


o senhor pâncreas, vizinho do fígado
dá-se bem com o dr. estômago
que mora no apartamento abaixo 
das irmãs cordas vocais
gêmeas estridentes e vetustas 
mas que pouco mal 
parecem fazer a alguém


na cidade de egópolis
o senhor olho e seu vizinho, o outrolho
vigiam a cobertura.
pouco sabem da vida secreta
dos moradores da cobertura
das orgias da cobertura
das agressões na cobertura
mas lá do alto reparam
as vidas de toda a cidade
exceto que não podem ver
os movimentos daquele morador 
que arrota todo dia 
e nunca passa perfume


os olhos, mesmo sabendo das mentiras
silenciosas da cobertura
dão cobertura
e calam por medo ou respeito 
quando a moradora de baixo
porta-voz em vários idiomas
mente descaradamente 
falando em nome do sindico, do zelador 
dos ricos e dos habitantes da parte baixa
os mesmos desafortunados
de sempre


a cidade, quando cala, fala!
egópolis, quando fala, falafalafala!

3.2.18

Um textículo: "JLB"


A cidade de Yia era a única da região que tinha um biblioteca, mantida por um estranho cavalheiro de pele rija, tez achocolatada e vasta cabeleira lisa. Ele dizia que  sua família descendia de bugres. Nada podia ser confirmado, já que ninguém os conhecia. "Os vivos estão todos no Paraguai", dizia, e encerrava a conversa.
Quando faleceu, uma morte súbita e estúpida, atropelado por uma bicicleta, entre seus pertences foram encontrados alguns livros antigos de alquimia, um mapa antigo rasgado com um indicação de um tesouro escondido e uma quantia razoável em dinheiro, guardado num baú. E uma carta puída e sem data, escrita por um certo Jorge Luís Borges.
O investigador, leitor ávido de Agatha Christie, separou para si uma parte do dinheiro e o mapa incompleto. Preencheu a declaração com o valor restante, os livros e outros bens  espalhados pela casa. A carta ele achou que era um documento desnecessário para a investigação, amassou e jogou no saco com o lixo.

2.2.18

Um textículo: "cópula"


Os melhores sons da vida são descompassados, roucos, surdos e desafinados. 
Pra que mesmo serve o diapasão?

1.2.18

Um textículo: "renovação"



aproveita
é ano novo e todos estão comemorando
alguma coisa
que não compreendo
me convida para sair contigo
e ir para algum lugar nem tão distante
mas não tão perto assim
e juntos poderemos viver alguns momentos
de uma paz irreal ou uma guerra delicada
aproveita e entrelace meus cinco dedos suados aos seus
toque esse peito cheiod e música
tire um som de minha voz

aproveite
tire a máscara que tento esconder
e dê sua mão para a minha, negligente
e nem tente disfarçar a carícia que quer fazer
e eu finjo não perceber
esboce essa monalisa, sua arquitetura perfeita
enfastiada
e pegue no copo, beba mais um gole,
só para preencher o tempo e o gesto bobo que
iniciou e não sabe como acabar

aproveite o ano novo
e renove o que quiser
que até não fazer nada novo
em nossa relação
pode ser uma inovação da gente