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29.12.15

Entrevista: DANIEL CARVALHO (Literatura, educação e música) - São Paulo

Ganhador do Prêmio Paulo Freire 2015 (foto Marco Tito - arquivo Facebook)

Depoimento para o Portal R7  (foto - arquivo Facebook)

O volume II do Entre Versos Controversos (foto Lucas Barbosa)


Daniel Carvalho, que declara ter mais que as sete faces drummondianas, é poeta, músico e educador na zona leste paulistana. Mas só o entendemos mais integralmente quando nos damos conta que cada uma das expressões pelas quais se desnuda na verdade é sempre uma continuidade da outra. E que esse pleno exercício da cidadania (pois o múltiplo artista coexiste somente nessa condição, a de ser essencialmente um cidadão!) diversifica-se em vetores que refletem e indicam caminhos para a arte (e humanidade) possíveis, apesar dos percalços, reacionarismo e arbitrariedades.
Este depoimento, colhido numa conversa de quase um mês via inbox do Facebook, revela um ser integrado ao seu tempo e à vida, exalando o bálsamo da Arte.


1) Quem é Daniel Carvalho?
Daniel Carvalho... boa questão, estou há 26 anos tentando descobrir quem ele é... Responderia talvez com um trechinho de um poema que escrevi ano passado: "não sou o homem de apenas sete faces,/ pois, possuo uma face/ a cada amor,/ a cada dor, /a cada experiência." Talvez seja um sonhador que vive cada uma das faces e fases da existência.

2) Você é um músico que "encontrou" a poesia, ou um poeta que também pratica a música? Explique-nos como a arte substancia sua vida:
Comecei a estudar flauta doce aos 7 ou 8. Depois fui para o violão, guitarra e assim por diante. O contato com a poesia foi nas primeiras tentativas de compor música. Acredito que encontrei (ou fui encontrado?) a música primeiro. A poesia mesmo, o desejo de ser poeta, não sei bem onde começou. Lembro que meu primeiro poema foi, sem ser música, na faculdade. Depois dei um grande tempo em composições, fazia apenas música instrumental. Com um projeto de literatura que desenvolvi com alunos e alunas do Ensino Fundamental II, essa chama poética reacendeu e voltei a escrever poemas.

3) E a carreira no magistério, como surgiu?
Comecei a ensinar violão/guitarra aos 14. No final do Ensino Médio, tive professores que mudaram minha vida. Esses dois fatos me motivaram a entrar pra Educação.

4) O que você chama de "tive professores que mudaram minha vida"?
Professores cujas aulas lembro até hoje, aulas que me fazem refletir até hoje.

5) O que você gosta de ouvir? De ler? De assistir?
Difícil resposta (risos). Isso daria um bom papo que duraria horas. Acho melhor falar do que mais gosto, delimitar os principais (risos). De ouvir, gosto muito de uma banda chamada Symphony X, é de metal progressivo. Muito bem trabalhados os álbuns, músicos muito bons mesmo. Mas, gosto desde baião, jazz, rap, até o metal do tipo System Of A Down, então é complicado resumir.
De ler, caímos noutro dilema pra resumir a resposta (risos). Meu escritor favorito é Dostoiévski. Tenho todos os livros traduzidos para o português e acho fantástica a poética dele.
Sobre assistir... amo séries. E nem imagino como será o fim do The Walking Dead (risos). As que mais gostei até hoje foram Prison Break, Lost (sim, eu sei que era a maior viagem e é por isso que gostei) e Flashforward (certamente, a que mais mexeu comigo).

6) Você tem vivido intensamente o ambiente dos saraus e dos slams que acontecem na periferia. Conta pra gente esses fenômenos e as peculiaridades de cada um:
Ainda é difícil eu falar algo sobre essa nova experiência, pois é tudo muito recente. Eu fui levado a vida toda a negar minhas origens, negar a periferia, a acreditar que os "rolês" de verdade eram os que fazia na Vila Madalena, Paulista, ou em ruas do tipo "Aspicuelta". Os saraus de periferia e a literatura marginal me ajudaram a enxergar quanto é triste não nos reconhecermos em nosso território, em nossa casa, não nos reconhecermos em nossa própria história, discursos e cultura. Cada sarau, slam, etc., têm sua peculiaridade, mas o fio condutor de ambos é a voz periférica e de empoderamento de uma cultura, voz que todos parecem possuir em comum.

7) Agora conte um pouco da história do projeto Entre Versos Controversos:
O Entre Versos Controversos surgiu na EMEF Profº Aurélio Arrobas Martins. Uns alunos e alunas e eu nos reuníamos após o horário de aula pra cantar umas músicas, escrever uns poemas e, de repente, publicamos as duas coletâneas de poemas, começamos a participar de saraus, enfim... a história do EVC é longa e tão forte que nunca consigo escrever sobre ela direito (risos).

8) Como foi o lançamento do Vol. II do Entre Versos Controversos? E por que o subtítulo "O canto de Itaquera"?
Foi uma festa bem bacana. Fiquei surpreso com os alunos e alunas mandando os poemas de cabeça, sem precisar ler e interagindo com o público. "O canto de Itaquera" foi escolhido para mostrar o encanto que há no canto da nossa quebrada. O canto pode ter dois significados: 1) espaço físico, canto no sentido de uma região que fica à margem, e 2) canto no sentido de voz, de empoderamento.

9) E o que você está planejando para 2016?
Na verdade, não tenho nada muito certo. Não sei se o que tenho são planos, desejos, sonhos, etc. Preciso antes sentar, refletir e pensar. Acho que ainda não organizei meu tempo pra conversar comigo sobre o que pretendo fazer em 2016 (risos).

10) Tem alguma questão que gostaria que eu tivesse perguntando e não o fiz? Se tiver, faça-a você mesmo e a seguir responda. Grato!
Puxa! Já é difícil responder. Imagina perguntar (isso)
Talvez, uma boa pergunta seria "que é a poesia?". Eu responderia que poesia significa muitas coisas, mas a parte que me chama mais atenção é que ela pode ser um instrumento potencialmente humanizador. Ela pode nos ajudar a entender o mundo, a nós mesmos e o outro - que é e não é diferente de nós.

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