A capa desta edição lida e comentada d´O Diário de Anne Frank |
Reprodução de páginas originais do diário de Anne Frank |
O Diário de Anne Frank
Difícil, difícil mesmo chegar ao fim deste livro e não se sentir
despregado chão, como se estivesse suspenso numa nuvem escura e densa. O Diário
de Anne Frank, muitos já o sabem, é um livro que foi escrito pela jovem judia enquanto
esteve escondida com sua família, num canto da Holanda, fugindo da perseguição
nazista. Escrita assim, até com certa frieza distante, esta resenha não dá
conta do enorme arcabouço de sensações e sentimentos que são fornecidos a cada
linha, durante a leitura.
Com uma sinceridade surpreendente, a adolescente traz para as linhas
escritas a sofreguidão do Anexo (local onde sua família e mais algumas pessoas ficaram
reclusas por mais de dois anos) e a construção de uma maturidade construída à
força, diante da intransigência dos fatos. Anne é, antes de tudo, uma garota
normal e, naturalmente, vaidosa, teimosa e inconstante. Inteligente, sua sinceridade às vezes é
cortante. E a violência de algumas de suas palavras – nem sempre necessária – desconcerta.
Nascida em 1929 na Alemanha, sua família muda-se para a Holanda em 1933
quando a ascensão do nazismo no seu país de origem implica no início da
perseguição desses aos judeus. Quando a guerra começa de vez e a Alemanha
invade a Holanda, aos judeus resta esconder-se, no aguardo de que a Inglaterra
envie suas tropas para desobstruir o país. Em 1942, nada há para se fazer senão
aguardar. Seu pai, Otto, ajudado por amigos não judeus, decide radicalizar
quando a situação fica insustentável. Todos se escondem num cubículo dentro do
escritório onde funciona a empresa no qual Otto trabalha.
É ali, escondida no sótão que Anne escreve seu diário, ao qual dá o nome
de Kitty. Em suas linhas, a adolescente em formação fala do dia a dia, da difícil
convivência com cada um dos moradores do lugar, da incompreensão de sua mãe, das
paixões juvenis antes e durante o cativeiro, da admiração pelo pai. Anne não
foge de qualquer assunto que ganhe relevância em sua mente inquieta. Discorre
com naturalidade incomum para uma garota de sua idade, tecendo comentários
ácidos sobre família, política, sexo, sentimentos, planos para o futuro, sem
deixar de pautar também as mínimas coisas que aconteciam ao seu redor. Todo assunto se torna importante para ser
comentado com Kitty.
Após denúncia, Anne Frank, seus familiares e outros “moradores” do anexo,
foi presa na manhã do dia 4 de agosto de 1944. Morreu no campo de concentração
em Bergen-Belsen aos 15 anos, em data incerta, provavelmente no início de 1945,
vitimada pela tifo que dizimou milhares de pessoas nos campos de concentração.
A causa para esse genocídio foram várias mas principalmente as péssimas
condições de higiene desses locais.
Parece provável que a vida seja mais novelesca que a própria arte (esta,
um engenho humano) mas compreensivelmente, a (re)leitura de O Diário de Anne
Frank fornece alguns indícios interessantes. O último texto de Anne, escrito em
1º de agosto de 1944, tem um aprofundamento melancólico não observado em suas
outras páginas, ainda que o diário viesse num “crescendo” niilista, diluído em
elucubrações introspectivas de muita força e poder. Chama a atenção que
justamente os “sobreviventes” do genocídio – seu pai, as jovens funcionárias do
armazém, Bep e Miep, além dos gerentes Kluger e Kleiman, tenham sido os
“poupados” das críticas atrozes que ela teceu nas suas linhas ácidas durante o
tempo de cativeiro. É como se o tempo tivesse feito justiça às elucubrações
juvenis e poupado os “bonzinhos” de sua epopéia.
Escobar Franelas
O Diário de Anne Frank
Edição definitiva por Otto H. Frank e Mirjam Pressler
Tradução Alves Calado
Ilustração de capa Pedro Meyer Barreto
Design de capa Fabíola Gerbase e Pedro Meyer Barreto
RJ: BestBolso, 2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário