Reprodução da capa do livro Sujeito Sem Verbo, de Fernando Rocha |
Fernando Rocha no Sarau da Casa Amarela, São Miguel Paulista (foto: Xavier) |
Sujeito Sem
Verbo – Fernando Rocha
Introspecção.
É sobre esse signo que os seres animados nascidos da canetadas e tecladas de
Fernando Rocha surgem e se dão à vida. Animados é quase irônico, reconheço.
Vivos pela pulsão de vida que corre em suas veias, são inanimados no sentido
existencial do termo. Assim, ora em primeira pessoa, ora em segunda; às vezes
sob a ótica masculina, em outras sob o ângulo feminino; os personagens de seus
contos são figuras quase apagadas, pálidas, sem força ou expressão, deambulando
por aí, cumprindo a sina dos dias, aguardando o ponto final. Da vida. Ou do enredo.
O autor é conhecedor
das elucubrações de seus personagens. Sabemos disso. Das linhas quase
simétricas de seus 50 contos brotam personalidades que parecem dialogar com Fernando
Rocha, cujo sorriso tímido por trás dos óculos – onde também se escondem dois
olhos vivazes – dão a certeza de um profundo diálogo entre criatura e criador. O
autor nos dá pistas a todo tempo de que conhece profundamente as idéias e os
mundos de cada dos seus protagonistas. É assim que em “Beleza” temos um texto
cuja fartura está na economia das palavras. Com pouco, muito pouco, o autor nos
diz muito, demais, além da conta. O conto principia e três minutos depois, em
seu final (sim, os textos de Fernando são curtíssimos), temos a ironia, a
crítica à hipocrisia social via elipse sintática e recortes certeiros do
marceneiro que sabe o que fazer com a madeira crua. E nua. “Como não havia mais
nenhum outro candidato, conseguiu, era a mais nova arrumadeira de defuntos da
região”.
É assim também
com “O Canto da Sereia” e “O Pequeno Poderoso”, entre outros, onde um riso
incisivo, “em passant”, aponta um artista incomum, que “cons-destrói” a lógica
encadeada que é sumariamente desordenada pelo ineditismo criador do autor.
Outros
exemplos de boa prosa de Fernando Rocha podem ser citados aos montes, aqui. Fico
com mais um trecho, seqüestrado do conto “Antes do Pó”, cuja beleza reside na
construção poética carregada de imagens e sugestões: “Uma das mais belas
imagens que vi nesta vida: o mar quase escondendo o sol refletido naqueles
olhos”. E outro, “A Estrada”, pela absoluta singularidade e precisão na descrição:
“A longa estrada pareceu exigir mais do que sua habilidade como motorista podia
oferecer”.
Quando elejo
este autor como mote para este estudo, é pela certeza de que Fernando Rocha,
assim como diversos outros autores à margem da grande via midiática, sendo ele
substancialmente periférico, independente, negro e avesso à exposição desnecessária,
há de ser trazido à luz, não pelos raios destes escritos que ora rascunho, mas
porque outros ainda farão a mesma declaração. E seu “Sujeito Sem Verbo”, uma
caixa de pequenas pérolas adornadas pela capa enigmática, há de conquistar
muitos, milhares, milhões, de leitores por lugares e tempos por aí afora.
Escobar Franelas
RJ: Confraria
do Vento, 2013, 1ª edição.
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