Recebeu a notificação da prefeitura, iriam lacrar a porta do estabelecimento.
Seus gestos eram autômatos, o raciocínio lento. Sem saber o que fazer com aquele monte de pássaros, pediu ao fiscal autorização para retirar os mesmos, "senão os bichinhos vão morrer presos aqui". O homem anuiu com um gesto de cabeça, "mas vai rápido, tenho outras lojas pra visitar hoje".
Então ele recolheu as gaiolas, os sacos de ração, guardou no carro, iria levar tudo pra casa.
Depois de alguns dias na quarentena, recluso, sem trabalhar, com pouca comida e nenhum dinheiro, estava atônito com aquela orquestra incômoda e faminta. Resolveu soltá-los.
Abriu as gaiolas, virou as costas e se retirou, não queria acompanhar o espetáculo deprimente de ver "seus meninos" indo embora. A partida, porém, foi lenta e sutil, de pios confusos, cada um alçando seu voo improvisado, como um filme em stop-motion.
Na manhã seguinte a revoada estava lá, retornara aos caprichos servis da rotina. Apenas aquele que cantava mais estridente na gaiola, justamente a cacatua que ele mais teve dó de soltar, encontrou morta.
Apesar da insistência dos bichos, fez questão de manter as portas fechadas.
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