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2.10.08

O Cão Quer Morrer

Hoje, como ontem, como sempre, tomei café na rua. Uma mania antiga que tenho, a de tomar muito café, em qualquer lugar, a qualquer hora, sem respeitar muito os critérios de asseio exigidos pelo meu estômago. É uma coisa meio autômata e anômala. Quer dizer, verdade seja dita - e tem que ser "bendita"! - às vezes, como hoje, bebo café em casa, mas esse foi curto, rápido, com um dessabor de requentado. Então... tome-lhe café da padaria, de barraquinha, ou de "donas Marias" diversas em esquinas ou filas diversas. Rerrequentados ou - pior ainda! - mornos.
Pois bem, eu e o Dailor Varela, poetaço, ele um dos genitores do poema-processo na década de 1960 em terras potiguares; o dito está passsando uns dias em meu casebre, aqui na província de Sampalândia; eu e ele fomos ontem visitar o Sacha Arcanjo, cantador dos bons, músico e poeta mineiramente baiano, estabelecido nas terras de São Miguel Paulista, aqui, bem "pertinho" (de novo mineiramente falando) de casa , na zona leste paulistana. Então, como eu tava dizendo, fomos visitar o Sacha. O Dailor dirige um jornal no Vale do Paraíba, SP, "O Grito", e queria uma entrevista com esse baiano incandescente e bem-humorado, letrista que honra a língua pôrtugo-brasileira, com seus achados poéticos ricos e sutis.
Conversa vai conversa vem, a entrevista rolou, eu aproveitei e filmei, e daí fomos tomar um cafezinho lá na esquina da av. Nordestina, numa padariazinha dessas comuns em vilas e bairros. Estava chovendo pacas. Tomamos uns vanilas e voltamos em papo animado. Mas eis que quando saía porta afora, tropecei num autêntico viralata. Branco amarronzado, cara pidona e triste mas esperto o suficiente para roubar o lanche de algum incauto distraído, ele olhou-me inquiridor, como a exigir desculpas, que, obviamente, pedi no olhar. Depois de atravessar a avenida, olhei para trás e os olhos dele me seguiam entre grossas gotas de chuva.
Esqueci o caso logo em seguida quando voltamos pra casa . Hoje cedo acordamos, eu e o Dailor, enganamos o estômago e fomos nos compor com um cafezinho básico no terminal Itaquera. Àquela hora, já umas nove e pouco, não tinha mais aquele frenesi de horas antes, quando sequer conseguimos andar no meio da multidão compacta, acelerada para pegar metrô, trem, lotação ou ônibus, e sumir na massa férrea em direção ao trabalho.
Descemos da van, achamos uma lanchonete não muito aprazível mas com poucos fregueses, e pedimos dois cafés. As balconistas conversavam animadamente sobre algum show no próximo final de semana e tive que repetir o pedido mais de uma vez. O café veio intragável. Biquei e despejei o resto no tambor que tinha ao lado. Não sei para que servia, mas eu queria evitar qualquer tipo de argumento por não ter tomado aquele líquido. Espero sinceramente que alguém tenha me feito o favor de reclamar daquele visgo preto de 70 centavos. Eu, agora, só queria ir embora logo. Iríamos encontrar o jornalista e escritor José Nêumanne em seu escritório, lá na sede da editora "A Girafa". O Dailor queria aproveitar a estadia na Pauliceia e matar a saudade do amigo com quem morou junto nos anos 70 e aproveitar e fazer uma entrevista para seu tabloide.
Não sei para que servia aquele enorme balde de plástico ali ao lado da barraquinha, mas foi lá que lancei o "pretóleo" que, respingando no plástico, acabou por cair no chão, onde foi sorvido rapidamente por um viralata. Branco e amarronzado. Esse filadaputa de cão quer morrer, pensei de relance. Mas o que ficou vivo em minha memória foi o célere salto que deu, para agarrar o copinho antes que caísse no chão. Equilibrista da sobrevivência, ele.

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