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28.7.14

Entrevista para o SP Cultura (Rede Globo)



Por conta do Blablablá, uma roda de debates que acontece mensalmente na Casa Amarela, em São Miguel, gravamos neste último sábado alguns depoimentos para o quadro SP Cultura, dirigido pelo Alessandro Buzo para o programa SPTV , da Rede Globo. Buzo, com sua equipe (Nogueira na câmera e Chantilly no áudio), fizeram entrevistas com alguns dos gestores da Casa (eu, Akira Yamasaki e Sueli Kimura), além de outros parceiros e também alguns convidados presentes.

A Casa Amarela é um espaço voltado para a prática artística, também atuando com ênfase em aspectos ligados à educação e à sustentabilidade. O local já foi residência técnica dos grupos de teatro Alucinógeno Dramático e Diotespíssio, local de gravação de diversos filmes curtametragens, sede do Programa Jovens Urbanos (uma parceria entre as instituições IPEDESH, CENPEC e Itaú Social) e do Programa Marginal (entrevistas para web). Atualmente exibe a exposição em madeira do escultor Euflávio Madeirart., além de apresentar mensalmente o sarau da Casa (dirigido por Akira Yamasaki) e o Blablablá (facilitado por mim).

O Blablablá prevê discutir em seus encontros tudo o que se refere à produção e expressão cultural fora dos grandes centros. Sempre com convidados que apresentem em seus currículos trabalhos relevantes sobre o tema abordado, no último dia 26, tinha como convidados, além do próprio Buzo, também o escritor Sacolinha (Suzano, SP), e a pesquisadora Érica Peçanha. O tema era "Literatura marginal: o que é?" e também teve a participação especial da poeta pernambucana Socorro Nunes.

O SP Cultura é um quadro fixo de todos os sábados do jornal diário SPTV, apresentado por Alessandro Buzo, na Rede Globo. Seu foco é a produção cultural no universo das periferias, destacando sempre ações e personagens que transformam o ambiente em que vivem através da arte, do esporte e da educação.

Endereço: http://casamarela-e-cultural.blogspot.com.br/ 






Texto de Escobar Franelas
Fotos de Andréia Gonçalves Garcia
Arte do flyer por Manogon

13.7.14

Ninguém Lê – Um projeto feito por quem escreve... e quem lê





Ninguém Lê – Um projeto feito por quem escreve... e quem lê

Chego ao Hussardos, ali na Praça da República, faltando 15 pras sete da noite. Reconheço alguns, cumprimento o Victor “Praga de Poeta” Rodrigues, rapidamente faço novas amizades. Não passa cinco minutinhos e encontro Ni Brisant, sempre brisando na sua fala manêra, no sorriso fácil, nas intervenções sempre inteligentes e bem sacadas. Vai começar o Ninguém Lê, um projeto que pretende dar voz e leitores para os escritores ditos marginais, afastados das luzes midiáticas. Mantido pelo VAI (Prefeitura de São Paulo), o Ninguém Lê prevê a escolha de alguma obra de determinado autor. Os organizadores distribuem o livro para o público, que se compromete a ler e participar do evento na data previamente agendada.
Fui pela primeira vez a este encontro depois que o Victor me convidou, durante o sarau na livraria Suburbano Convicto e entregou-me um exemplar de Punga, de Elizandra Souza e Akins Kintê.
Sete e pouco, fazemos a roda que a cada cinco minutos tem que ser ampliada, mais e mais gente chegando, as idéias rolam, evoluem, impulsionam. Victor e Ni propõem que o pessoal da roda vá lendo os poemas de Punga, dos dois convidados, para a conversa do Ninguém Lê. O mote é trocar idéias com os autores, saber de influências, histórias de vida, métodos de escritas, militância e outros papos interessantes  sobre a obra em discussão. A leitura dos poemas de poetas tão complementares revela uma certa sincronicidade de temas e abordagens. Quando surge a oportunidade, leio MenstruAção, poema de Elizandra que gera um certo desconforto na exposição. Quase no fim da conversa, a poeta acaba discorrendo sobre essa questão, o desconforto de provocar o público quando ele está mais vulnerável, muitas das vezes querendo apenas fruir o auspício poético.
Após a leitura dos poemas, surgem as provocações. Questionado sobre a forma como divulga seus trabalhos, Akins respondeu que anda sempre com uma sacola com alguns trabalhos. E mais, que leva seus trabalhos nos ensaios das escolas de samba e nos campos de várzea, entre outros lugares. Daniel Marques, um dos organizadores do sarau “O Que Dizem os Umbigos?”, no ItaimPaulista, relata a sensação de que os poemas de ambos apontam sofrimentos mas sobretudo a beleza de quem ama e pergunta se eles têm consciência dessa escrita, ao que Elizandra responde que visualiza uma mudança consciente mas, paradoxalmente, não consegue dimensionar essa mudança. Victor lembra que o texto de Akins “ginga” naturalmente e ele confirma, sorridente, afirmando que “quando a ´chapa tava quente´, o que me salvou foi a arte, a música”.
Surgem novas dúvidas, sobre como é o processo criativo de cada um. Ambos exemplificam as formas que utilizam para chegar aos resultados finais de seus versos. Akins solta mais uma pérola, “sábado eu estava no Conjunto Inácio Monteiro (zona leste), ouvindo um funk, e fiquei prestando atenção às palavras, aos versos”, para falar de onde vem a inspiração, a troca de energia, a descoberta do insight que permitirá a explosão de um novo poema, ou uma nova música. Mais adiante, o poeta de “Divinéia”, falando da atualidade de Punga, mesmo após sete anos da primeira edição, citando que “a poesia é atual pois as coisas permanecem”. Elizandra, por sua vez, explicou sucintamente que gosta muito de ler dicionários. Nesse ínterim, Ni aponta que Punga tem discussões que apontam para a realidade que os poetas vivem ainda hoje. Ambos concordam.
E as interpretações se sucedendo. Todo o público, vibrante e participativo, aprofunda temas, suscita assuntos, pergunta sobre influências e outros etecéteras. Querem discutir as relações de gênero dentro do movimento hip-hop, os movimentos sociais a partir de junho de 2013, as relações entre as diversas expressões da arte e até o que significa Punga. Elizandra Souza explica que a palavra, cuja origem está no dialeto banto, significa um convite para “entrar na roda”, para dançar. Akins Kintê conclui rindo que punga também significa furto e que gosta muito dessa palavra. Depois presta contas, afirmando que foi Allan da Rosa, mentor do livro, quem deu este título à obra.
Às nove e meia, Ni Brisant anuncia o fim do evento, o Hussardos bateu seu horário, precisa ser fechado. Akins sugere que se alguém tem alguma dúvida, que mande para ele por meios virtuais, que ele responderá. Por fim lê “Divinéia” e Elizandra, “Antítese”.
Segundo os organizadores, o próximo encontro acontecerá no início de agosto e que a convidada será a poeta Sinhá, e o livro a ser lido e discutido é “devolva meu lado de dentro”.
Quem quiser acompanhar as atividades do Ninguém Lê, as informações atualizadas estão na página https://www.facebook.com/ninguemle do Facebook.






texto e fotos Escobar Franelas 

9.7.14

Resenha - livro "O Diário de Anne Frank"

A capa desta edição lida e comentada d´O Diário de Anne Frank

Reprodução de páginas originais do diário de Anne Frank


O Diário de Anne Frank

Difícil, difícil mesmo chegar ao fim deste livro e não se sentir despregado chão, como se estivesse suspenso numa nuvem escura e densa. O Diário de Anne Frank, muitos já o sabem, é um livro que foi escrito pela jovem judia enquanto esteve escondida com sua família, num canto da Holanda, fugindo da perseguição nazista. Escrita assim, até com certa frieza distante, esta resenha não dá conta do enorme arcabouço de sensações e sentimentos que são fornecidos a cada linha, durante a leitura.
Com uma sinceridade surpreendente, a adolescente traz para as linhas escritas a sofreguidão do Anexo (local onde sua família e mais algumas pessoas ficaram reclusas por mais de dois anos) e a construção de uma maturidade construída à força, diante da intransigência dos fatos. Anne é, antes de tudo, uma garota normal e, naturalmente, vaidosa, teimosa e inconstante.  Inteligente, sua sinceridade às vezes é cortante. E a violência de algumas de suas palavras – nem sempre necessária – desconcerta.
Nascida em 1929 na Alemanha, sua família muda-se para a Holanda em 1933 quando a ascensão do nazismo no seu país de origem implica no início da perseguição desses aos judeus. Quando a guerra começa de vez e a Alemanha invade a Holanda, aos judeus resta esconder-se, no aguardo de que a Inglaterra envie suas tropas para desobstruir o país. Em 1942, nada há para se fazer senão aguardar. Seu pai, Otto, ajudado por amigos não judeus, decide radicalizar quando a situação fica insustentável. Todos se escondem num cubículo dentro do escritório onde funciona a empresa no qual Otto trabalha.
É ali, escondida no sótão que Anne escreve seu diário, ao qual dá o nome de Kitty. Em suas linhas, a adolescente em formação fala do dia a dia, da difícil convivência com cada um dos moradores do lugar, da incompreensão de sua mãe, das paixões juvenis antes e durante o cativeiro, da admiração pelo pai. Anne não foge de qualquer assunto que ganhe relevância em sua mente inquieta. Discorre com naturalidade incomum para uma garota de sua idade, tecendo comentários ácidos sobre família, política, sexo, sentimentos, planos para o futuro, sem deixar de pautar também as mínimas coisas que aconteciam ao seu redor.  Todo assunto se torna importante para ser comentado com Kitty.
Após denúncia, Anne Frank, seus familiares e outros “moradores” do anexo, foi presa na manhã do dia 4 de agosto de 1944. Morreu no campo de concentração em Bergen-Belsen aos 15 anos, em data incerta, provavelmente no início de 1945, vitimada pela tifo que dizimou milhares de pessoas nos campos de concentração. A causa para esse genocídio foram várias mas principalmente as péssimas condições de higiene desses locais.
Parece provável que a vida seja mais novelesca que a própria arte (esta, um engenho humano) mas compreensivelmente, a (re)leitura de O Diário de Anne Frank fornece alguns indícios interessantes. O último texto de Anne, escrito em 1º de agosto de 1944, tem um aprofundamento melancólico não observado em suas outras páginas, ainda que o diário viesse num “crescendo” niilista, diluído em elucubrações introspectivas de muita força e poder. Chama a atenção que justamente os “sobreviventes” do genocídio – seu pai, as jovens funcionárias do armazém, Bep e Miep, além dos gerentes Kluger e Kleiman, tenham sido os “poupados” das críticas atrozes que ela teceu nas suas linhas ácidas durante o tempo de cativeiro. É como se o tempo tivesse feito justiça às elucubrações juvenis e poupado os “bonzinhos” de sua epopéia.

Escobar Franelas


O Diário de Anne Frank
Edição definitiva por Otto H. Frank e Mirjam Pressler
Tradução Alves Calado
Ilustração de capa Pedro Meyer Barreto
Design de capa Fabíola Gerbase e Pedro Meyer Barreto
RJ: BestBolso, 2013


8.7.14

Resenha - livro "Sujeito Sem Verbo" (Fernando Rocha)

Reprodução da capa do livro Sujeito Sem Verbo, de Fernando Rocha

Fernando Rocha no Sarau da Casa Amarela, São Miguel Paulista (foto: Xavier)

Sujeito Sem Verbo – Fernando Rocha

Introspecção. É sobre esse signo que os seres animados nascidos da canetadas e tecladas de Fernando Rocha surgem e se dão à vida. Animados é quase irônico, reconheço. Vivos pela pulsão de vida que corre em suas veias, são inanimados no sentido existencial do termo. Assim, ora em primeira pessoa, ora em segunda; às vezes sob a ótica masculina, em outras sob o ângulo feminino; os personagens de seus contos são figuras quase apagadas, pálidas, sem força ou expressão, deambulando por aí, cumprindo a sina dos dias, aguardando o ponto final. Da vida. Ou do enredo.
O autor é conhecedor das elucubrações de seus personagens. Sabemos disso. Das linhas quase simétricas de seus 50 contos brotam personalidades que parecem dialogar com Fernando Rocha, cujo sorriso tímido por trás dos óculos – onde também se escondem dois olhos vivazes – dão a certeza de um profundo diálogo entre criatura e criador. O autor nos dá pistas a todo tempo de que conhece profundamente as idéias e os mundos de cada dos seus protagonistas. É assim que em “Beleza” temos um texto cuja fartura está na economia das palavras. Com pouco, muito pouco, o autor nos diz muito, demais, além da conta. O conto principia e três minutos depois, em seu final (sim, os textos de Fernando são curtíssimos), temos a ironia, a crítica à hipocrisia social via elipse sintática e recortes certeiros do marceneiro que sabe o que fazer com a madeira crua. E nua. “Como não havia mais nenhum outro candidato, conseguiu, era a mais nova arrumadeira de defuntos da região”.
É assim também com “O Canto da Sereia” e “O Pequeno Poderoso”, entre outros, onde um riso incisivo, “em passant”, aponta um artista incomum, que “cons-destrói” a lógica encadeada que é sumariamente desordenada pelo ineditismo criador do autor.
Outros exemplos de boa prosa de Fernando Rocha podem ser citados aos montes, aqui. Fico com mais um trecho, seqüestrado do conto “Antes do Pó”, cuja beleza reside na construção poética carregada de imagens e sugestões: “Uma das mais belas imagens que vi nesta vida: o mar quase escondendo o sol refletido naqueles olhos”. E outro, “A Estrada”, pela absoluta singularidade e precisão na descrição: “A longa estrada pareceu exigir mais do que sua habilidade como motorista podia oferecer”.
Quando elejo este autor como mote para este estudo, é pela certeza de que Fernando Rocha, assim como diversos outros autores à margem da grande via midiática, sendo ele substancialmente periférico, independente, negro e avesso à exposição desnecessária, há de ser trazido à luz, não pelos raios destes escritos que ora rascunho, mas porque outros ainda farão a mesma declaração. E seu “Sujeito Sem Verbo”, uma caixa de pequenas pérolas adornadas pela capa enigmática, há de conquistar muitos, milhares, milhões, de leitores por lugares e tempos por aí afora.
Escobar Franelas

 Sujeito Sem Verbo – Fernando Rocha
RJ: Confraria do Vento, 2013, 1ª edição.


6.7.14

"Sobrenome Liberdade" - isso sim é pós-nome de sarau

    
    Guardem esses nomes: Ni Brisant, Mano Ril, Luz Ribeiro e Eduardo Dias. São eles o quarteto fantástico que na primeira quinta-feira de cada mês quebram todas as barreiras no Grajaú e realizam o Sarau Sobrenome Liberdade. O sarau que tem o nome mais emblemático entre todos os que rolam na periferia vibrante da Sampalândia - agora posso dizer - é impactante. Impactante e fodástico. Fodástico e inspirado. Inspirado e transpirado.
    Foram mais de três horas para cruzar a cidade em horário de pico, errar o caminho, reafirmar a certeza de que placas indicativas de trânsito são um luxo inexistente na periferia da zona sul, tanto quanto na leste e que o GPS na ponta dos dedos de algumas pessoas indicam o contrário (mas que em outras têm um acerto preciso e milimétrico), para, enfim, chegar ao Relicário Bar e viver uma noite indescritível em louvor à deusa Poesia. 
   Luz, Mano, Eduardo e Ni fazem um sarau intertextual, multiexpressivo e poliinspirado. Arte farta e po- derosa: o bar recebe bem, com serviço cortês, cerveja no ponto e porções com preço justo. E, mais importante, o palco recebe protagonistas de todos os matizes artísticos, muita vibração, irmandade leve e solta, público sorridente, amabilidade no atacado. Como não se sentir bem num  lugar assim?
   Pude falar um pouco do livro que levei, "Itaquera - Uma Breve introdução", mas principalmente, ouvi, vi , curti e fruí intensamente a Arte rica e profunda de todos os que ocuparam o local sagrado do culto poético.
    E quando fui embora - antes do fim, tinha que cruzar Sampa em direção à leste novamente - levei comigo essa saudade, esse saber e esse sabor que, hoje, domingo, três dias depois, ainda perdura. Saudade de todos os meus novos irmãos...

"Bebês Agnósticos" (poemeu)

- Você crê em longe após o perto?
- E você, acredita
em vida após o parto?

(IN, haicaos, no prelo)