Pesquisar este blog

30.6.16

haiquase (exercício VIII)

Foto: reprodução de um gráfico com a representação possível do caos (http://palabrerias.com.mx/cuento-al-borde-del-caos-autor-axel-blanco-castillo/) 

o êxtase da boca
aberta pelo espanto
desarma o amargo


Um poema: "Onanix"

Foto: capa da cia. teatral ARTcetera

fazer à mão
o verso curto:
poema imaginário


(da série "haicaos", no prelo)

29.6.16

25.6.16

Quem diria?, ou, Recado-de-amor para o filho



Quem diria?
Há menos de duas décadas, em noites ainda muito vivas no arquivo da memória, às vezes quentes e abafadas, às vezes frias demais, às vezes nem tanto, ficávamos ali, você atento me olhando compenetrado e eu lendo O Pequeno Príncipe pra você dormir. E quantas vezes – talvez a maioria delas! – eu acabava cochilando antes! Ia se aninhando, escorregando para baixo do edredon e, num átimo, estava em outro país, em outro universo, uma outra vida. Acordava geralmente bem depois, sob o som do seu ressonar suave. Nessas horas, abandonava você no asteróide B612, no Sítio do Picapau Amarelo ou no meio de alguma aventura com Pedro Bandeira, Stella Carr, Lucília Junqueira de Almeida ou Julio Verne e voltava para minha nave, o meu quarto.
Depois o trem do tempo parou numa nova estação e aí veio você me pedindo sugestões do que ler. Lembro algumas indicações, nem sempre convenientes ao seus interesses, creio, mas que respondiam à minha ânsia de querer envolver com muita coisa que “fez minha cabeça” quando tinha essa mesma idade bonita que você tem agora. E tome-lhe Camus, Pirsig, Arthur Conan Doyle, Daniel Lopes, Agatha, Bukowski (que você, como eu, sentiu arder na boca do estômago)!
E agora, vinte anos depois daqueles nãnãnãs pra embalar seu sono, agora – tão pouco, tão longo tempo – o trem estacionado num novo terminal, você vem e “pai, você precisa ler este livro! É muito foda.” Recebi o livro, com a nota de compra numa livraria cara perdida entre as páginas, eu pensando cá com botões e zíperes, “pô, ele podia ter me falado, teria encontrado pra ele em algum sebo dos que visito”. Tolo, eu! Deixa o moleque ser feliz do jeito dele, deixe ele abrir suas janelas com as próprias mãos!
Abri e me concentrei na leitura. Viajei com ele por uma adolescência em formação. Enfrentei o deserto gelado do Alasca para encontrar a redenção, através da mão segura de meu filho. Me rendi a ele.
Terminei a leitura. E você tem razão, filho, Na Natureza Selvagem, do Jon Krakauer é muito foda mesmo! Ainda que contrariemos o enredo da aventura. Aqui, meu filho, não nos perdemos, não nos afastamos: nos encontramos.
A propósito, qual a próxima indicação?
Abraçaço. Seu pai.
(foto de divulgação do filme “Na natureza selvagem”, Into the wild, 2008)

17.6.16

Comunidade do Conto - Experiência lúdica, única, múltipla


CdoC reunida. Foto: http://www.portalnews.com.br/_conteudo/2016/05/variedades/30550-comunidade-do-conto-apresenta-producoes-sobre-filosofia-e-religiao.html
Ainda não tinha falado disso mas é preciso por os pontos no is, para fazer justiça ao que é justo. Recentemente, a convite do escritor e articulador sócio-cultural Sacolinha, tive a oportunidade de participar de uma das etapas do projeto Comunidade do Conto, que rola organiza em Suzano, SP.
Pelo que sei, o CC existe/resiste desde 2010, criado pela Associação Cultural Literatura no Brasil, da qual Sacolinha é um dos mentores. Trata-se de dois encontros com um público previamente selecionado para a sacralização do conto, contando com a mediação luxuosa de algum convidado especial. A condição básica é que este (ou esta) convidado (a) tenha notoriedade, expressão e argumento sobre o tema proposto. 
Dessa vez, o profº e escritor Sérsi Bardari, que tem uma ficha corrida enorme com a literatura (e educação), ligado umbilicalmente ao universo jovem. A proposta era debater álcool e juventude e a seguir produzir um texto em prosa relacionado ao assunto.  Após o primeiro encontro, voltamos para casa e tivemos então trinta dias para fazer um (ou vários) conto (s) abordando o tema. 
O CC traz uma diversidade de interesses àqueles que desejam adentrar/discutir o gênero conto. Uma delas é o “olho-no-olho” da conversa, que permite o aprofundamento das questões, o sanar dúvidas e a troca de saberes/idéias/influências de uma maneira muito espirituosa, pois tudo é concertado pelo viés da compreensão, respeito e afabilidade. O encontro, cujo prazer é literário mas também humanamente humano, propicia o enriquecimento lícito, a apropriação cultural, a prática da escutatória e o fomento das digressões críticas. Isso incorre diretamente em outra questão, a meu ver tão importante quanto: a recuperação da prática da oralidade, uma das mais belas formas de comunicação entre seres. Terceiro, o desinchaço do ego, através da leitura compartilhada, da atenção ao pormenor, da crítica direta e educada. 
Convenhamos: hoje, exarcebados pela cultura do selfie, do “faça você mesmo” (do it yourself), estamos todos propensos a um protagonismo intermitente, sem pausa para a autocrítica e a ponderação. Fugir disso é o primeiro passo para a construção de um trabalho sólido que possa superar a temporalidade da maioria das obras que estão sendo produzidas nesse exato momento.
Outro aspecto relevante a ser relatado é o gozo de estar entre pares, gente duplamente bela, cujos sorrisos e palavras tive a fortuna de degustar. Povo que está produzindo com afinco trabalhos inspirados, transpirados e renovados. Inspiradores, transpiradores e renovadores. Para nós, para as letras brasileiras.
Cito as três novas parceiras/amigas Lídia Irecson, Adriana Calabró e Patrícia Cardoso – todas elas da confraria Beco dos Escritores – entidade literária da zona oeste, que cruzaram a cidade de São Paulo, sentido Alto Tietê, e das quais obtivemos três textos suntuosos e equilibrados, somados a gostosas conversas e fecundos apontamentos. Puro deleite a vivência com elas. Também tive o prazer de conhecer a simpaticíssima contista Mônica Franco e o cordelista Francis Gomes, de quem já conhecia o tesouro poético mas não sabia que confessava outros gêneros literários. Além, claro!,  do texto urdido com ferro e fogo do sempre surpreendente Sidney Leal (de quem,  aliás, já tive o prazer de prefaciar um livro de contos) e o deliciante João Tereza, conto do Sacolinha, que a cada dia reafirma sua condição de protagonista na literatura brasileira renovada neste princípio de século.

Escobar Franelas

13.6.16

Um poema: "Defloraflor"

lambe, lambe


Cafuné de vento
Cabelos que despenteiam
Olhos que escaneiam
Dedos como raios
Urros como trovões
Peles que imantam-se
Pelos que pelam-se
Mãos que tateiam
Gestos que prendem
Gestos que libertam
Sussurros que flamejam
Vulcões acelerados
Vulcões de lava-mel
Vulcões que incendeiam
Seios que são desfiladeiros
Pênis vibradores
Pênis que cospem leite
Pênis pau-pra-toda-obra
Seios que são meus, são seus, são seis
Cus que sugam
Cus que dão choque
Cus que cagam faíscas
Elétricas
Tudo tudo é forma de amar, do amor
Tudo tudo é devorador
Tudo tudo é defloraflor

7.6.16

haiquase (exercício IV)

Foto: reprodução da capa do disco Todos os Olhos, de Tom Zé


a epifania no oco
grávido de sutis fantasias
pisca o olho mais lindo

(da série "haiquase")

3.6.16