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30.6.12

Um poemeu: "Politicamente correto, ou ´Cartografia de tempos ignorantes´"

entre o século vinte e o seguinte, surgiram muitas subespécies, a saber:
subchatos, neochatos, maxichatos, prêt-à-chatos, narcochatos, ecochatos, nanochatos, afrochatos, antichatos, vicechatos, sobrechatos, indie-chatos, jump-chatos, free-chatos, media-chatos, live-chatos, up-chatos, chatos-generation.

ia citar também os down-chatos, mas aí é redundância.

27.6.12

Textículo: "Sampalândia"

Sampalândia é meu playground favorito, ainda que único, ainda que sujo, ainda que específico, ainda que com tantas outras coisas barreirísticas.
Sampalândia é um vale, um planalto, uma montanha. É um sonho, uma fantasia, uma utopia. Sampalândia é a Dublin de Joyce, o Sertão de Rosa, a Pasárgada de Bandeira.
Sampalândia é uma e são tantas. É terra de ninguém, e é continente. Como meu coração.


26.6.12

Cronicazica: "Alegria em preto-e-branco "

Quando aconteceu a copa de 82 na Espanha, fazia mais ou menos uns dois anos que meus pais tinham comprado o primeiro televisor. À época, eu tinha uns 13 anos e era virgem em entendimento de futebol. Não assistira à copa de 78, nunca fôra a um estádio, só jogava bola no campinho ao lado de casa(Guaianases, extremo periférico a leste, na cidade de São Paulo). Todo o meu conhecimento futebolístico se resumia às audições de Osmar Santos, Fiori Gigliotti e José Silvério, nas rádios Globo, Bandeirantes e Jovem Pan, respectivamente.

O clima que tomou conta das ruas na véspera do jogo de estréia do Brasil, contra a URSS - aquele país enorme ("e ainda por cima comunista!", como dizia a minha mãe)que hoje se resume em vários outros menores - era uma mistura agridoce de tensão e festa, apreensão e alegria, dúvidas e apostas. Nós, moleques, discutíamos e reescalávamos o time diversas vezes, como se a partida fosse de xadrez. Todos tínhamos idéias de movimentos táticos e escalações mais inteligentes, como se fôssemos o Mequinho do futebol tupiniquim. No dia do jogo, a turma ouriçou-se toda. Passamos a manhã toda discutindo a equipe, se o Telê deveria escalar um ponta-direita fixo ou não; quem era melhor a ponta-esquerda, se o Éder, o Zé Sérgio ou o Mário Sérgio; quem era mais goleador, o Serginho ou o Roberto Dinamite; se o Batista deveria jogar ou não.

Eu, solitário em minhas convicções, queria o Nunes e o Adílio. Ainda estava encantado com aquele Flamengo campeão do mundo em 81. Tiraria o Chulapa e o Falcão(!?). E o meu ponta esquerda seria o João Paulo, do Santos. Mas a rua silenciou, e todos foram para a casa do Vagão, a única do quarteirão que tinha televisão em cores. Tive que assistir o jogo sozinho. Minha mãe me proibira de sair. Estava de castigo, nem lembro a razão.

Os times entraram em campo e perfilaram-se para a execução dos hinos nacionais. Por momentos, fiquei na dúvida se deveria ficar em pé e imitava o Sócrates, solene e lírico com a mão no peito. Por vergonha do meu irmão menor que estava a meu lado, preferi ficar na minha, cantando baixinho.

Logo no início do jogo, senti os primeiros comichões de prazer, vendo a troca de passes quase cirúrgica entre Sócrates, Zico, Cerezo e Falcão. Ainda hoje trago comigo essas imagens, vivas na memória afetiva, tanto quanto a lembrança do primeiro beijo, a primeira transa, o primeiro emprego, o passar no vestibular e a aprovação no exame de habilitação.

Veio então o baque, a profusão do sentimento de perda, a laceração provocada pela dor: tomamos um gol, quando tínhamos pleno domínio da partida. O  mundo ruiu e chorei quieto no meu canto. Duvidei. Odiei. Lancetei um asco de impropérios contra o Telê, o Valdir Peres, o Papa, Deus, o juiz, o Figueiredo. E, a partir daí, vi crescer a figura gélida do Dassaiev, um golias travestido de goleiro, que revelava-se uma muralha intransponível.

No intervalo fui para a rua. A patota reuniu-se em digressões, traçou planos, fez previsões. O Vagão, vermelho como um pimentão, também tinha chorado. O Marcelo reclamava porque o Nilton Batata não estava jogando. Os irmãos Paulo e Chico reclamavam, mas entramos em comunhão por um segundo tempo melhor. Tínhamos fé que nós iríamos nos encontrar no fim do jogo para comemorar. Juramos que iríamos ganhar.

A equipe do Brasil, no início do segundo tempo, continuava seu ziriguidum em torno da meta da URSS(sequer sabíamos onde ficavam "aqueles comunistas" branquelos nos mapas da aula de Geografia). A bola, no entanto, relutava em atingir o gol deles. Até que num toque simples(os mais belos momentos da vida sempre são simples; um beijo, um sorriso, um abraço, um afago), e o Falcão, com sua elegância romana, deixa a bola passar, enganando toda a defesa e dá a Éder a chance de dar dois únicos e "inequívocos" toques na bola, um para alçar, o outro para fuzilar aquela assombração russa.
Demorei para comemorar o gol. Estava em êxtase pela beleza sutil da jogada.

A partir daí não mais me permiti acreditar em derrota, sequer em empate. E minutos depois, o gol majestoso de Sócrates, depois de dois cortes laterais na zaga adversária, só confirmou aquilo que eu já previra.

Até o fim do jogo, fiquei à mercê de uma expectativa eufórica. Quando o juiz apitou o fim (ufa, enfim!), senti-me doentemente feliz, tanto que nem fui para a rua. Primeiro tive que ir ao banheiro. Meus amigos foram me chamar mas tiveram que esperar um pouco. Minha primeira comemoração foi - digamos assim - "disfuncional".

25.6.12

À (MODA) UILCON PEREIRA - "EU, UM VAMPIRO DE TEXTOS ALHEIOS"

O senhor se considera um otimista?
Sim, um cronista.

Quais foram as suas fontes?
O amor fraco, DNA do terror.

O senhor se sentia solitário?
Lembro que fui para a praia no dia seguinte.

Como foi tocar aqui dessa vez?
Não, sou um idelista.

Qual foi o maior medo que o senhor já enfrentou?
Não sei, mas sou basicamente um otimista.

Qual mundo eles enfrentarão quando forem adultos?
Uau, esta é um hora linda do dia, não?

A senhora falou em auto-análise... O que aconteceu com ela?
Porque sou eu. Minha história com o surfe é de curtição. Eu ensinei meus filhos a pegar onda. Até minha mulher pega onda. Tem vezes que conversamos coisas da família dentro da água.


(Poema retirado a partir de perguntas-respostas de jornais e revistas diversos, com personalidades as mais variadas)

22.6.12

Essa semana... (cronicazica)

Rascunho essas linhas sem saber o que, por onde e como começar, sem saber exatamente o que falar.
Inicio apenas para exercitar os lados descansados que precisam de movimento, luz, água, alimento e cor, e assim dar combustível ao meu afazer e meu pensar.
Quando começo a escrever, na maioria das vezes é assim: vou traçando linhas malemalescritas, apenas para dar forma e signo a ideias que ficam ululando em minha cabeça. Já vi falar de artistas diversos que escrevem, pintam, dançam, compõem, façam o caralho-a-4 apenas porque "vozes" ficam a sarilhar em seus ouvidos, e então eles saem desembestados, a produzir algo que dialogue com essas vozes interiores. Outros já declararam que fazem arte para não enlouquecer. Estou entre eles.
Gasto fortunas de tempo produzindo linhas que provavelmente ninguém nunca lerá. Mas é minha maneira de marcar território, de olhar o centro da corola da vida e dizer "aqui estou", "este sou eu", faz parte de meu viver essa fuga para a lonjura abstrata, onde fico horas a fio dentro do casulo, a tecer fios que permitirão que esse ermitão depois saia destilando cor e  luz na vida, sua e dos mais próximos.
Isso é, se alguém se disponha a trocar seu tempo comigo, com meu umbigo, com meus rabiscos.

Visões de outras "ões" (foto feita com celular "xing ling")

16.6.12

A democratização da moda

Tecido retorcido, SP, 2009

Mova-se.
Essa é a premissa para aqueles que desejam ver a vida sob luzes.
E não bastam o sol, o néon, os fulcros de glórias, os rojões...
Não! É preciso muito mais; uma conquista diária, constante, solidária, perseverante, histórica, solitária, social. Enfim, uma CONQUISTA.
Conforme sofismou nosso poetinha, olha que coisa mais linda, mais cheia de graça... Estava eternizada a idéia de que a vida é uma passarela. Os pequenos triunfos são as luzes que indicam o quê, como, quando e porque nos vestimos. Nós vestimos algo ou nos tornamos nus, porque temos o poder da opção, porque somos animais civis. Queremos(e pra sempre) dividir nossas memórias, êxtases e fantasias, com alguém quem nos note; veja que somos sol intenso, luz densa em neurônios substantivos e paixões adjetivas. Queremos tomar conta do mundo, mas com carinho; embalar o planeta, cantando uma velha canção de ninar; mimar a lua, abraçar o sol. Pois só somos felizes se nos vêem, se nos notam, se nos cantam. Se fazemos isso para alguém.

Cortina de ônibus, SP, 2009

14.6.12

Tarde no litoral

Santos,  SP, 2012
"Vento No Litoral"

(Legião Urbana)

De tarde quero descansar
Chegar até a praia e ver
Se o vento ainda está forte
E vai ser bom subir nas pedras

Sei que faço isso pra esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando
Tudo embora...

Agora está tão longe
ver a linha do horizonte me distrai
Dos nossos planos é que tenho mais saudade
Quando olhávamos juntos
Na mesma direção
Aonde está você agora
Alem de aqui dentro de mim...

Agimos certo sem querer
Foi só o tempo que errou
Vai ser difícil sem você
Porque você está comigo
O tempo todo
E quando vejo o mar
Existe algo que diz
Que a vida continua
E se entregar é uma bobagem...

Já que você não está aqui
O que posso fazer
É cuidar de mim
Quero ser feliz ao menos,
Lembra que o plano
Era ficarmos bem...

Eieieieiei!
Olha só o que eu achei
Humrun
Cavalos-marinhos...

Sei que faço isso
Pra esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando
Tudo embora...


Fonte:

10.6.12

Um poemeu: "Pátrio Nosso"

rezar a vida
muito mais aves-
marias


(Melhor poesia no Projeto "Arte na Cohab", Prefeitura do Município de S. Paulo, 1998, p. 23) 

Campos Elíseos, SP, 2012


9.6.12

Um poemeu: "Elite e Heresia: Exegese"


os beatles já foram mais famosos que jesus

cristo é tão famoso quanto maomé

pelé é mais famoso que jesus

cristo é mais famoso que tiger woods, roger federer e michael schumacher, juntos

Abstração, 2012


6.6.12

Um poemeu: "Se´u não puder pirar"


se´u não puder pirar
num mundo tão ordeiro
ahhh...

ó bundas e coxas excitantes
deep purple e mick jagger excitantes
aromas fedores e estertores tão excitantes
adorno e adornos excitantes
esse instantes são excitantes
se´u não puder pirar
fumando baseado num vão
se´u não pirar num divã
se´u não puder um não
trânsito mulher elevador sogra correspondência
sexo antíteses estrelas

se´u não expirar
antes

(hardrockcorenroll, SP: Scortecci, 1998)

Autorretrato de autoria desconhecida, com celular, 2011

5.6.12

Análise Fílmica – Panic (The Smiths)


Panic on the streets of London
Panic on the streets of Birmingham
I wonder to myself
Could life ever be sane again
On the Leeds side-streets that you slip down
I wonder to myself
Hopes may rise on the Grasmeres
But honey pie, you're not safe here
So you run down
To the safety of the town
But there's panic on the streets of Carlisle
Dublin, Dundee, Humberside
I wonder to myself
Burn down the disco
Hang the blessed d.j.
Because the music that they constantly play
It says nothing to me about my life
Hang the blessed d.j.
Because the music they constantly play
On the Leeds side-streets that you slip down
On the provincial towns that you jog'round
Hang the d.j., hang the d.j., hang the d.j.
Hang the d.j., hang the d.j., hang the d.j.
Hang the d.j., hang the d.j., hang the d.j.
Hang the d.j., hang the d.j.
Hang the d.j., hang the d.j.
O clipe da música Panic (The Smiths), permite uma panorâmica concisa mas abrangente da época em que foi lançado, 1986. A música do quarteto de Manchester, Inglaterra, foi um single que fez muito sucesso nas paradas. Banda herdeira do movimento punk que tinha irrompido alguns anos antes em terras londrinas, o The Smiths não resistiu à estafa existencial e á própria condição major, desmembrando-se tempos depois.
Como qualquer movimento juvenil, o punk trazia um idealismo quase de todo impraticável, tanto que foi defenestrado em poucos anos. Tinha forte teor político e fincava seus compromissos numa radicalização contra o mainstream imposto pelas gravadoras. O refrão do it yourself (“faça você mesmo”) que os punks proclamavam, permitiu um novo horizonte para milhares de bandas que pipocavam no mundo todo e que não enxergavam o óbvio, que sua música não precisava de grandes selos para serem produzidas e distribuídas. Com as novas tecnologias que surgiam, era possível fazer-se música de forma artesanal e mais barata, às margens da grande indústria cultural. O anarquismo enquanto visão política tornava-se também a prática laboral desses jovens.
A banda que melhor expressou essa nova onda é o Sex Pistols. Eles também representaram, figurativamente, o ocaso dessa agitação punk, quando implodiram, menos de dois anos após seu surgimento. As taxas altas de consumo de drogas pesadas (como heroína e cocaína), as divergências surgidas entre as lideranças e o aliciamento da grande indústria, faz com que haja um rompimento com o passado imediato, toda a revolução já tinha sido assimilada pelo engenho capitalista, que a tudo devora e consome. Tal como no movimento de uma década atrás, o sonho novamente acabara.
O desencanto dessa nova utopia que fugia registra o surgimento de bandas que, simbolicamente, representam esse período. Algumas dessas bandas são The Smiths, The Cure e U2.
As letras, o posicionamento político, a questão visual, a assimilação do videoclipe como depositário de novas idéias artísticas, tudo isso reverbera na nova música que se faz e que se ouve. Assim, figuras como Bono e Morrissey simbolizam os novos paradoxos que surgem no meio dessa crise existencial.
O clipe de Panic sintetiza todas essas possibilidades que são exploradas naquele período. Rodado em preto-e-branco, num ritmo frenético, revela todo o potencial de uma música orgânica, nervosa, urgente, crítica e desencantada.
A voz anasalada de Morrissey explicita essa observação down das ruas bretãs (mas que poderiam ser as ruas de qualquer metrópole do mundo). Ronald Reagan e Margareth Tatcher (a poderosa Primeira-Minsitra britânica), estavam cancelando todas as conquistas sociais e do mundo do trabalho, por conta da grave crise do petróleo da década de 1970. Milhares de jovens londrinos estão desempregados, à toa, sem perspectiva de vida. Ao mesmo tempo, as novas tecnologias que vão surgindo vão criando uma aura já antevista por George Orwell em seu 1984 (“O Grande Irmão”, que tudo olha e a tudo vê), e por Aldous Husley em A Revolução dos Bichos. Percebe-se no jovem protagonista do clipe o desconforto dessa câmera que flerta com ele, dialoga com ele, incomoda ele. A mão inquieta que atravessa todo o percurso fílmico, ora implora, ora oferece, ora aponta, ora “quer pegar” alguma coisa que não sabemos mas que podemos entender. Ela quer interferir nas realidades das ruas, dos distritos, do mundo, da vida. O travelling é descompassado, anárquico, indo em direções contrárias e conflitantes, misturando-se um ao outro pelo recursos da fusão.
As ruas do filme são vistas como são na realidade, sem subterfúgios, com suas mensagens pichadas nos muros, suas sujeiras à espera do recolhimento, e suas pessoas dispersas e distraídas.
A angústia hamletiana é inserida em destaque, às vezes em colorido flamejante, enquanto as crianças são zumbis, anexadas às imagens pelas infinitas possibilidades que agora são permitidas com os novos recursos técnicos e o manuseio mais simplificado das câmeras. E, num gesto de sublevação estética, enquanto Tatcher é queimada, a voz deprimida conclama “hang the dj”. Estaria o bardo propondo o enforcamento da “dona” da festa?
Uma nova cultura é possível, sim, pois surgem novos elementos tecnológicos que permitem uma nova postura política.

* Análise de um produto audiovisual solicitada pelo professor Gilberto Vieira (ETEC Jorn. Roberto Marinho, Brooklyn, São Paulo, SP). Busquei The Smiths por ser uma obra de referência em minha formação  tanto comportamental quanto intelectual. 

Fontes:

3.6.12

Um poemeu: "Demais Pra Mim"

Por favor, entenda, eu tô bem longe
tanto de funk quanto de gospel
tanto de crack quanto de incenso
tanto de pinga quanto de coca
tanto de pedra quanto de Pedro
tanto de homem quanto de animal
tanto de homem quanto de mulher
tanto de homo quanto de hétero
tanto de carne quanto de espírito
tanto de ontem quanto de amanhã
tanto de louco quanto de são
tanto de fortes quanto de fracos
tanto de burros quanto de espertos
tanto de cigarras quanto de formigas
tanto de princesas quanto de escravas
tanto de certo quanto de errado
tanto de preto quanto de branco
tanto de preto quanto de cor
tanto de Deus quanto do diabo
tanto de Deus quanto de Alá

Só a
e
o
me interessam

Mais nada

Meditação, 2009