Era uma casa velha, com alpendre caindo, janelas esburacadas e teto comido por cupins e umidade. Ainda está lá, agora reformada, modificada, reerguida, com as linhas simétricas e retas da arquitetura contemporânea. O erro é meu, reconheço, perdido em afetos, nas lembranças dos anos pretéritos. Era uma casa velha e somente agora a vejo e bestializado, descubro que era apaixonado por aquela que não é mais. Não há mais. Sou apaixonado pelo que foi.
E da varanda envidraçada desse momento percebo uma piscadela sutil, irônica, sediciosa, me convidando a redescobri-la, sob a cortina estampada que dança suavemente à luz do sol de uma tarde que se esvai, e logo será outro passado, outra memória, uma esperança dirigida para trás. O vento flana e consigo distinguir seus silêncios de senhora impessoal, perceber suas entranhas monocromáticas de poucos móveis, as linhas fálicas de seu desenho frio, o desejo de ser nobre, quase
elegante; elegante, de uma frieza quase rude. Enquanto o amanhã não chega e tenho dificuldades em entabular este flerte, curto com pudor a velhice de ontem ameaçando o porvir.
O amor é extático.

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