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2.8.13

CEU Aricanduva tem palestra sobre zona leste com profº Paulo Fontes



Ana Matos, José Maria, Sandra Kanashiro, Valter Almeida, Paulo Fontes, Luana Bhering e Taísa Costa (foto Antonio Primus)

As mudanças de paradigmas quanto às periferias são tangíveis e cada vez mais explícitas. Muita gente está pesquisando, inquirindo, construindo e defendendo o antigo subúrbio, agora modificado em seu contexto, mas ainda assim afastado do núcleo decisório, tanto no âmbito econômico quanto no político. No caso específico da zona leste de São Paulo e, mais pontualmente ainda, em Itaquera, o assunto é mais avassalador. Faltando 10 meses para o início do evento que mais atrai a atenção da mídia mundial na atualidade – a Copa do Mundo de Futebol em 2014 – que terá seu chute inicial no bairro. Todo o seu entorno ganha discussões, plenárias, estudos, especulações e intervenções.
Um pouco deste aprofundamento foi oferecido pelo CEU Aricanduva, nesta sexta feira, 2 de agosto, que promoveu o ciclo de palestras História da Zona Leste. O convidado da manhã, o profº doutor Paulo Fontes (UNICAMP), trouxe um apanhado geral da história da região – principalmente os séc. 20 e 21 – atrelando suas observações a um campo amplo de discussões sobre os novos protagonistas dos micropoderes que emanam dessa evolução constitutiva da sociedade.
Atestando que “essa discussão é fundamental para entendermos as coisas e planejarmos o futuro”, Fontes compôs um painel longo e elucidativo do conceito de periferia dentro da historiografia moderna. Para tanto, recorreu a temas atuais, ou “urgentes”, como “muita gente pensa que o gigante acordou agora, mas ele estava acordado desde há muito tempo”, ponderou.
Partindo de dados de sua pesquisa, asseverou que “São Paulo é a cidade que mais cresceu no mundo, no século 20”, não sem antes lembrar que essa condição faz com que haja uma mudança radical na caracterização geral da cidade, de onde ela estava no fim do século 19 e onde se encontra hoje, em pleno século 21.
Assim, foi possível ao pesquisador aprofundar suas considerações sobre a região leste da capital, ou, como enunciou, os “subúrbios orientais da cidade”, como eram conhecidos anteriormente. Discorrendo sobre esse envolvimento com a história e a memória do lugar, Fontes projetou três características principais dessa periferia, ainda que reconheça a todo momento que a “periferia” não é homogênea, como muitos instauram, tampouco simplesmente heterogênea. Há, segundo o educador, uma multiplicidade imagética na qual todos incorremos quando queremos estabelecer uma medida simbólica para o universo periférico como um todo.
Baseado nisso é que ele a vai traçar as características da periferia leste, a saber, a) que toda ela é “popular” diante da interpretação do senso comum; b) toda ela traz consigo um saber cultural intrínseco pelas próprias peculiaridades de seu surgimento. Aqui, o autor cita como exemplos pontuais o teatro anarquista no Brás do início do século 20 e o Movimento Popular de Arte (MPA), de São Miguel, no último quarto do mesmo século; c) as lutas sociais (sociedades amigos de bairros, sindicatos, ligas dos moradores - década de 1910 - novos movimentos sociais a partir dos anos 1970 etc.).
Fontes ainda enumerou três fases distintas na constituição dos bairros orientais. Segundo ele, a primeira grande onda de industrialização, potencializada pelo café mas transformada no centro urbano pela indústria têxtil, oferece o painel inicial dessa ocupação, que atingiu os bairros do Brás, Mooca, Tatuapé e adjacências. O segundo momento é o período posterior à 2ª Guerra Mundial, com o acentuamento da “segunda fase” da industrialização, agora focada na metalurgia. De acordo com o palestrante, é nesse momento que se estabelece o que ele citou como “padrão periférico de crescimento”, onde as moradias de regiões centralizadas encarecem, inflacionando o custo de vida e o aluguel, “expulsando” para mais longe os antigos moradores. “E a zona leste é absolutamente emblemática nisso”, asseverou Fontes.
É desse ponto que surge a terceira fase, com a autoconstrução em terras longínquas. “É nesse ínterim que o Brasil tem a maior migração interna dentro um país, no século 20”, registrou. Segundo ele, “hoje temos um movimento maior na China e na Índia” mas foi naquele período que houve esse remanejamento mais intenso de pessoas no país. E mais, “no fim do século 20 temos uma mudança na caracterização geral da zona leste, pois surgem enclaves de altíssimo poder aquisitivo que impactam tremendamente o lugar”, ponderou, para finalizar em seguida: “Precisamos de políticas públicas em torno da história e da memória. Não tem jeito, temos que consultar as fontes materiais e imateriais. Por que as escolas da região não têm acervos sobre a zona leste? Por que as bibliotecas não podem se transformar em centros de memória?”, questionou.
Vários profissionais trouxeram à tona questões pertinentes ao tema discorrido por Fontes. Algumas perguntas ajudam a elucidar as problematizações surgidas com a palestra.
 Taísa da Costa Endrigue, Coordenadora de Planejamento e Desenvolvimento Urbano da Subprefeitura de Itaquera, fez um adendo explicativo, “o avanço da zona norte esbarra na Serra da Cantareira, no sul para nos mananciais”, frisou ela. E constatou, “resta, então, à zona leste, que tem uma topografia mais plana”.  Externando uma preocupação lúcida, apesar de sua pouca idade e longa experiência (ela tem apenas 25 anos), Taísa finalizou seu raciocínio, “os empreendedores imobiliários conhecem as leis. Nós, o povão, é que não conhecemos”.
Já o adolescente Caíque, estudante também presente ao encontro, questionou a importância do estádio para o bairro. Fontes responde, “o estádio tem seu aspecto simbólico-cultural norteado politicamente, não podemos nos esquecer disso. E esse determinismo vai nortear as ações de certos grupos que desejam valorizar uma região. Mas do ponto de vista educacional, a construção do estádio é um bom mote para ajudar a discutir o bairro, o entorno, as políticas públicas etc”.
Angelina, professora aposentada, trouxe outro aspecto relevante sobre a palestra. “Ouvindo suas histórias, me vi dentro de minha cassa, que foi construída nesse sistema de compadrio mesmo, mas era grande. Hoje me sinto sufocada no apartamento de meus filhos, de tão pequenos que são as construções”.
A palestra com Paulo Fontes faz parte de um projeto de fôlego maior intitulado “Estudo da Realidade Local”, organizado pela diretoria Regional de Educação de Itaquera. Outros eventos farão parte da agenda, que consolida uma demanda natural quanto ao protagonismo da região, assim como contempla a relação escola-comunidade, constituindo uma via de troca de vivências e saberes.
A mesa com os convidados, com Paulo Fontes ao meio (foto Antonio Primus)

Recepção do CEU Aricanduva, na abertura da palestra (foto Antonio Primus)

Público enorme e diversificado para ouvir Paulo Fontes (foto Antonio Primus)

Um comentário:

Jorge Ramiro disse...

Eu assisti lá, eu estudo no Tatuape e achei um evento muito bom, espero ter outro assim novamente em breve.