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13.7.14

Ninguém Lê – Um projeto feito por quem escreve... e quem lê





Ninguém Lê – Um projeto feito por quem escreve... e quem lê

Chego ao Hussardos, ali na Praça da República, faltando 15 pras sete da noite. Reconheço alguns, cumprimento o Victor “Praga de Poeta” Rodrigues, rapidamente faço novas amizades. Não passa cinco minutinhos e encontro Ni Brisant, sempre brisando na sua fala manêra, no sorriso fácil, nas intervenções sempre inteligentes e bem sacadas. Vai começar o Ninguém Lê, um projeto que pretende dar voz e leitores para os escritores ditos marginais, afastados das luzes midiáticas. Mantido pelo VAI (Prefeitura de São Paulo), o Ninguém Lê prevê a escolha de alguma obra de determinado autor. Os organizadores distribuem o livro para o público, que se compromete a ler e participar do evento na data previamente agendada.
Fui pela primeira vez a este encontro depois que o Victor me convidou, durante o sarau na livraria Suburbano Convicto e entregou-me um exemplar de Punga, de Elizandra Souza e Akins Kintê.
Sete e pouco, fazemos a roda que a cada cinco minutos tem que ser ampliada, mais e mais gente chegando, as idéias rolam, evoluem, impulsionam. Victor e Ni propõem que o pessoal da roda vá lendo os poemas de Punga, dos dois convidados, para a conversa do Ninguém Lê. O mote é trocar idéias com os autores, saber de influências, histórias de vida, métodos de escritas, militância e outros papos interessantes  sobre a obra em discussão. A leitura dos poemas de poetas tão complementares revela uma certa sincronicidade de temas e abordagens. Quando surge a oportunidade, leio MenstruAção, poema de Elizandra que gera um certo desconforto na exposição. Quase no fim da conversa, a poeta acaba discorrendo sobre essa questão, o desconforto de provocar o público quando ele está mais vulnerável, muitas das vezes querendo apenas fruir o auspício poético.
Após a leitura dos poemas, surgem as provocações. Questionado sobre a forma como divulga seus trabalhos, Akins respondeu que anda sempre com uma sacola com alguns trabalhos. E mais, que leva seus trabalhos nos ensaios das escolas de samba e nos campos de várzea, entre outros lugares. Daniel Marques, um dos organizadores do sarau “O Que Dizem os Umbigos?”, no ItaimPaulista, relata a sensação de que os poemas de ambos apontam sofrimentos mas sobretudo a beleza de quem ama e pergunta se eles têm consciência dessa escrita, ao que Elizandra responde que visualiza uma mudança consciente mas, paradoxalmente, não consegue dimensionar essa mudança. Victor lembra que o texto de Akins “ginga” naturalmente e ele confirma, sorridente, afirmando que “quando a ´chapa tava quente´, o que me salvou foi a arte, a música”.
Surgem novas dúvidas, sobre como é o processo criativo de cada um. Ambos exemplificam as formas que utilizam para chegar aos resultados finais de seus versos. Akins solta mais uma pérola, “sábado eu estava no Conjunto Inácio Monteiro (zona leste), ouvindo um funk, e fiquei prestando atenção às palavras, aos versos”, para falar de onde vem a inspiração, a troca de energia, a descoberta do insight que permitirá a explosão de um novo poema, ou uma nova música. Mais adiante, o poeta de “Divinéia”, falando da atualidade de Punga, mesmo após sete anos da primeira edição, citando que “a poesia é atual pois as coisas permanecem”. Elizandra, por sua vez, explicou sucintamente que gosta muito de ler dicionários. Nesse ínterim, Ni aponta que Punga tem discussões que apontam para a realidade que os poetas vivem ainda hoje. Ambos concordam.
E as interpretações se sucedendo. Todo o público, vibrante e participativo, aprofunda temas, suscita assuntos, pergunta sobre influências e outros etecéteras. Querem discutir as relações de gênero dentro do movimento hip-hop, os movimentos sociais a partir de junho de 2013, as relações entre as diversas expressões da arte e até o que significa Punga. Elizandra Souza explica que a palavra, cuja origem está no dialeto banto, significa um convite para “entrar na roda”, para dançar. Akins Kintê conclui rindo que punga também significa furto e que gosta muito dessa palavra. Depois presta contas, afirmando que foi Allan da Rosa, mentor do livro, quem deu este título à obra.
Às nove e meia, Ni Brisant anuncia o fim do evento, o Hussardos bateu seu horário, precisa ser fechado. Akins sugere que se alguém tem alguma dúvida, que mande para ele por meios virtuais, que ele responderá. Por fim lê “Divinéia” e Elizandra, “Antítese”.
Segundo os organizadores, o próximo encontro acontecerá no início de agosto e que a convidada será a poeta Sinhá, e o livro a ser lido e discutido é “devolva meu lado de dentro”.
Quem quiser acompanhar as atividades do Ninguém Lê, as informações atualizadas estão na página https://www.facebook.com/ninguemle do Facebook.






texto e fotos Escobar Franelas 

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