Pesquisar este blog

19.7.12

Depoimento - GILBERTO BRAZ (Poeta)

O poeta em ação: lirismo equilibrado (foto EF)

(A emoção de participar do Projeto Bem-Te-Vi)
GB – é uma emoção dupla, primeiro porque a gente tá aqui relembrando sempre, nessas oportunidades, a memória, o trabalho e a obra do Raberuan que, como todos sabem, era um artista magnífico, autor de uma obra fantástica e criador de personagens que eu, inclusive, incorporei em alguns shows dele, como o Cego Waldemar.
Outro motivo de satisfação é que o projeto visas reunir condições para a gente lançar o cd e o livro de poemas do Akira, que é o cara que promove todo tipo de atividade cultural, que incentiva todo mundo e que merece todo o esforço que a gente possa fazer. E também é dono de uma obra poética fantástica.
É maravilhoso estar aqui.

(Como você vê a cena cultural em S. Miguel hoje)
GB – Eu acho que a gente tem que analisar a cena artística, o movimento cultural, sob dois aspectos. O primeiro é daquela turma de produtores culturais, compositores, artistas plásticos, atores, atrizes, enfim, estudiosos da arte que estiveram envolvidos durante o Movimento Popular de Arte e que não abandonaram as suas atividades. Sob esse ponto de vista, a gente tem o Projeto Bem-Te-Vi assim como outros, sempre capitaneados pelo Akira, procurando recolocar cada categoria – vamos dizer assim- na cena artística do bairro e até da cidade.
E nós tos que analisar sob o ponto de vista das novas safras, pois a gente sabe que coisas acontecem em vários pontos, em vários lugares e que felizmente as novas gerações estão aí.
Caio Vandré, que hoje está tocando aqui, é um exemplo disso. As novas gerações estão surgindo, ocupando seu espaço.

(O que você tem feito, por onde tem andado, falando sobre sua poesia...)
GB – Meu trabalho, ele tem – digamos assim – ele tenta reunir as influências do contexto histórico que eu já vivi, que nasci e cresci e me formei. Então, existe um traço forte de nordestinidade em meu trabalho, não só pela minha família mas também pelo próprio bairro de S. Miguel Paulista, que tem um traço cultural forte de presença nordestina. Também tem outras nacionalidades e outras regionalidades, outros povos vivendo em s. Miguel, por exemplo, a comunidade árabe tem uma presença forte no bairro.
Então, dentro desse olhar cosmopolita ainda que genérico, a nossa obra acaba refletindo tudo isso.
Tenho procurado fazer um trabalho que, se não buscar, resgatar nenhum sentido, tenta incorporar influências que sempre ocorreram e procuram um caminho próprio, uma identidade própria, humildemente. Ninguém inventa nenhum estilo ou moda. Em literatura não inventam nada. Elas são frutos de um contexto histórico. Só depois de décadas é que vão analisar e dizer “isso aqui foi um movimento literário ou uma escola literária”.
Até porque nós somos influenciados e também influenciadores.

(Como você vê a produção literária hoje, no Brasil, no mundo, em São Miguel)
GB – A gente tem alguns valores, alguns poetas, alguns bons artistas, alguns bons arquitetos da palavra. Evidentemente, como em todo segmento artístico, existe também uma quantidade razoável de artistas e escritores que – digamos assim – estão dentro de um padrão que vem sendo desenvolvido já há algumas décadas.
Na verdade, quanto a estilo literário, a gente não conseguiu nada. Ainda estamos muito perto dos modernos e dos concretos, de João Cabral de Melo Neto, e de algum grupo de autores que ainda não foi substituído.
Os valores para substitui-los existem, mas eles passam e a nossa sociedade precisa produzir, dar espaço para estes valores. Infelizmente, estamos em um momento em que o caleidoscópio da mídia está tragando tudo para o buraco negro do lugar-comum, da frivolidade, das nulidades.
Então, é uma batalha em que ainda vai haver vencedores. Pra saber onde estão esses nomes a gente tem que pesquisar muito, procurar muito na marginalidade, nos circuitos alternativos. Porque nos circuitos “oficiais” não há muito espaço, não existem muitos nomes. É mais barato continuar produzindo os nomes já consagrados que produzir o novo.

(Como você vê a transversalidade de mídias)
GB – Em primeiro lugar, é muito rico, são muitas as possibilidades. Hoje você pode veicular um poema na internet com uma série de recursos multimídia, produzir seu poema com ferramentas e tecnologias acessíveis.
Mas ao mesmo tempo, todo esse caldeirão de coisas favorece a banalidade, a mesmice, muita gente fazendo a mesma coisa.
Pra criatividade sempre vai haver espaço. Agora, você tem que ir com lupa porque não é em todo lugar que você encontra grandes trabalhos, porque eles realmente estão por aí e não há muitos canais. Apesar da existência de diversas ferramentas multimídia, da convergência, ainda estamos dominados por uma mídia velha. O modelo antigo é que dita tudo, para onde vão as modas.

 EF e Gilberto Braz, trocando ideias na Casa de Farinha, S. Miguel (foto de Francisco Xavier)
 
Faz tempo

Faz tempo que eu penso em não publicar um livro.
Porque o que me motiva a escrever é o ato em si,
A busca pela Palavra precisa e vaga
Clara e reta, turva ou curva, tímida e ousada,
Rude às vezes, singela noutras situações.
O que me motiva é achar o tom, a sonoridade delas
E combinar sons e tema e brincar de compor com o poema.
Os fonemas são meus irmãos, cada sílaba que eu bebo
Cada palavra que trago não as trago por acaso:
Elas me escolheram, me acolheram em seu canto generoso
Dessa generosidade que só se encontra mesmo em Deus
E que me faz pensar que eu que as escolho,
Eu é que as acolho, na tola e doce presunção
De que o poema é meu.


diet-Éticas: etilicas sem dialéticas

O medo não mata barata
e o pavor dela era vapor
na nau catarineta e na internete.

Condenados eu e ele
passamos de reis a réus
pela simples troca de um i por um u
de um eu por um ai

Ela subiu na cadeira e gritou
"Abaixo o Mensalão e Viva a Revolução!"

Nos tribunais de Vossa Excelência
histeria ou história é coisa
que se dá pela absoluta troca de um e por um ó.

(Gilberto Braz)

Nenhum comentário: